Isótopo 188 de astato mostra decaimento raro ao expulsar protões

Um grupo internacional de físicos identificou um comportamento invulgar no isótopo 188 de astato (At-188): o núcleo liberta protões individuais, um processo de desintegração observado apenas em poucos casos e nunca num átomo tão pesado. A experiência decorreu no Laboratório de Aceleradores da Universidade de Jyväskylä, na Finlândia, e fornece novos dados sobre a estrutura da matéria nuclear.

Elemento mais raro da Terra volta a surpreender

O astato, composto por 85 protões, é considerado o elemento natural mais escasso do planeta; estima-se que exista menos de um grama distribuído na crosta terrestre. Todos os seus isótopos são instáveis e desintegram-se rapidamente. No caso do At-188, o núcleo contém 103 neutrões, combinando-se para formar o átomo mais pesado conhecido a emitir protões de forma isolada.

Habitualmente, os núcleos instáveis procuram estabilidade através da emissão conjunta de protões e neutrões (partículas alfa) ou pela transformação de neutrões em protões (decaimento beta). A expulsão de um único protão é, por isso, um fenómeno raro que oferece aos investigadores uma oportunidade única para testar modelos teóricos sobre a força nuclear.

Como foi conduzido o ensaio

Para produzir o At-188, a equipa disparou íons de estrôncio-84 contra um alvo de prata dentro de um cíclotron. As colisões fizeram fundir os núcleos dos dois elementos, originando núcleos altamente excitados que, em seguida, perderam partículas até alcançar o isótopo pretendido.

Os restos da reação foram separados com um dispositivo magnético que isola fragmentos de acordo com a sua massa e carga. Posteriormente, detectores de silício e um espectrómetro registaram a energia, o tempo de voo e as partículas emitidas. Estas medições confirmaram a libertação de protões individuais e permitiram calcular a meia-vida do At-188.

Núcleo alongado com formato “melancia”

Modelos computacionais aplicados aos resultados indicam que o núcleo do novo isótopo não é esférico. A análise aponta para uma forma alongada e achatada – comparada pelos autores a uma melancia. Esta geometria pode explicar a facilidade com que um protão atinge a periferia do núcleo e consegue escapar, mas o mecanismo exacto continua por esclarecer.

Henna Kokkonen, investigadora da Universidade de Jyväskylä e primeira autora do estudo, sublinha que “descobertas de isótopos são raras e este é o segundo astato que tenho a oportunidade de caracterizar”. Anteriormente, Kokkonen participou na identificação do At-190.

Implicações para a física nuclear

Segundo o físico Kalle Auranen, também da Universidade de Jyväskylä, registar a emissão de protões em núcleos pesados ajuda a refinar cálculos sobre a interação forte, a força fundamental que mantém protões e neutrões unidos. Ao confrontar previsões teóricas com medições precisas de energia e forma, os cientistas podem ajustar parâmetros e melhorar a compreensão de núcleos próximos dos limites de estabilidade.

O trabalho oferece ainda pistas para pesquisas futuras em elementos superpesados, cuja síntese requer métodos semelhantes. Determinar por que razão o At-188 adopta uma morfologia alongada pode fornecer indícios sobre a configuração de nucleões em sistemas ainda mais maciços.

Próximos passos

A equipa planeia repetir o ensaio com diferentes energias de feixe e alvos alternativos para verificar se outras combinações produzem isótopos com comportamentos comparáveis. Experiências complementares, envolvendo espectroscopia de raios gama, deverão clarificar a distribuição de carga e massa no interior do núcleo.

Apesar de a aplicação prática ser remota, o estudo contribui para o conhecimento fundamental da matéria e pode, a longo prazo, influenciar tecnologias que dependem de processos nucleares, como reatores avançados ou métodos de imagem médica.

Os resultados reforçam a ideia de que, mesmo nos elementos mais raros, persistem fenómenos capazes de desafiar os modelos estabelecidos e de ampliar as fronteiras da física nuclear.

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