iFood e Uber iniciam integração de aplicativos e firmam assinatura conjunta em meio à disputa pelo mercado de delivery

Quem, o quê, quando, onde e por quê
iFood e Uber oficializaram uma integração inédita entre seus aplicativos, que entrou em operação a partir desta segunda-feira na cidade de Belo Horizonte (MG). O acordo permite que usuários do iFood solicitem corridas da Uber sem sair do app de pedidos e, de forma recíproca, que usuários do aplicativo de mobilidade visualizem opções de entregas operadas pelo iFood nas próximas semanas. A parceria, que devolve a Uber ao segmento de entrega de refeições após a descontinuação do Uber Eats três anos atrás, foi concebida para ampliar a conveniência do consumidor, fortalecer a fidelização e responder a um ambiente de competição crescente no mercado brasileiro de delivery.
- Integração começa em Belo Horizonte
- Expansão gradativa até janeiro de 2026
- Clube iFood + Uber One: assinatura dupla de R$ 21,90
- Volta da Uber ao delivery de refeições
- Contexto competitivo: intensificação da chamada “guerra do delivery”
- Monitoramento do Cade
- Contratos de exclusividade e alegações de retaliação
- Disputas em tribunal e vigilância sobre palavras-chave
- Posicionamento da 99Food
- Implicações para usuários, restaurantes e motoristas
- Próximos passos
Integração começa em Belo Horizonte
Belo Horizonte foi definida como laboratório inicial da novidade. A escolha da capital mineira atende ao critério de iniciar testes controlados em um mercado de grande porte, porém menos saturado que metrópoles como São Paulo e Rio de Janeiro. Dentro do aplicativo do iFood, os usuários já encontram uma aba exclusiva para corridas, que direciona a solicitação diretamente à infraestrutura tecnológica da Uber. Em contrapartida, o aplicativo de mobilidade exibirá, em breve, ofertas de entrega que utilizam a rede logística do iFood, abrangendo refeições, itens de mercado e produtos de farmácia.
De acordo com as empresas, a integração técnica contempla a troca de dados operacionais essenciais — disponibilidade de motoristas, tempo estimado de entrega, cálculo de tarifas e rotas — respeitando a privacidade dos usuários e a autonomia de cada plataforma. O objetivo, segundo as companhias, é proporcionar transições sem fricção: a experiência de solicitar uma corrida ou de pedir uma refeição mantém a identidade visual e os padrões de usabilidade de cada aplicativo, ainda que as operações ocorram em infraestrutura compartilhada.
Expansão gradativa até janeiro de 2026
Após o piloto em Belo Horizonte, o cronograma prevê a expansão para grandes centros a partir de dezembro. Nessa fase, entram São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ), Brasília (DF), Curitiba (PR), Fortaleza (CE), Campinas (SP), Goiânia (GO), Recife (PE), Porto Alegre (RS) e Salvador (BA). A partir desse ponto, as duas empresas estimam concluir a implementação em todas as localidades onde já operam até janeiro de 2026.
A adoção de um modelo em fases foi decidida para monitorar estabilidade dos sistemas, ajustar oferta e demanda e prevenir eventuais falhas que prejudiquem a experiência do usuário. Durante cada etapa, equipes conjuntas de engenharia analisarão métricas como tempo de resposta do aplicativo, precisão de rotas e avaliação dos parceiros — motoristas, entregadores e restaurantes — antes de avançar para a próxima região.
Clube iFood + Uber One: assinatura dupla de R$ 21,90
No centro da aliança está o Clube iFood + Uber One, plano mensal de R$ 21,90 que reúne benefícios anteriormente separados em cada plataforma. O pacote entrega, no âmbito do iFood, cinco cupons mensais no valor de R$ 10 para restaurantes, frete grátis em compras de mercado e farmácia e cupons adicionais em campanhas sazonais. No universo da Uber, o assinante recebe 10 % de créditos proporcionais ao valor de cada viagem e dois descontos de 25 % — limitados a R$ 5 por uso — em corridas nas modalidades Comfort e Black.
Ao unir serviços de mobilidade e entrega, a assinatura busca criar um ciclo de fidelização. Dados das empresas indicam que somente metade da base de consumidores utiliza iFood e Uber de forma combinada. A expectativa, portanto, é converter usuários ocasionais em clientes frequentes, elevando a recorrência e o ticket médio nas duas verticais.
Volta da Uber ao delivery de refeições
A integração marca o retorno da Uber ao segmento de entrega de alimentos, encerrado com o fim do serviço Uber Eats. A retirada da marca do país havia deixado o iFood como player predominante em refeições por aplicativo. A volta ocorre agora de maneira indireta, utilizando a capilaridade da plataforma parceira em vez de relançar um serviço próprio. Para a Uber, o movimento representa a possibilidade de diversificar receita sem reconstruir uma operação logística completa.
Contexto competitivo: intensificação da chamada “guerra do delivery”
O cenário em que a aliança se insere é marcado pela intensificação da disputa entre aplicativos de entrega. A retomada de operações da 99Food e a chegada da chinesa Keeta trouxeram investimentos expressivos e acirraram a concorrência em grandes centros urbanos. Enquanto esses entrantes buscam participação de mercado com promoções agressivas e condições diferenciadas para restaurantes, o iFood, líder do setor, adota estratégias de retenção — entre elas, o acordo com a Uber — para sustentar sua posição.
Além dos novos competidores, a Rappi permanece atuando no país com foco em conveniência e entrega de ultrarraio. Juntos, esses aplicativos disputam consumidores sensíveis a preço, prazo de entrega e abrangência de ofertas, fatores que se tornam mais relevantes à medida que a inflação pressiona o orçamento das famílias.
Monitoramento do Cade
A escalada competitiva levou o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) a intensificar o monitoramento dos aplicativos de entrega em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Goiânia. O órgão acompanha denúncias sobre práticas comerciais e avalia a possibilidade de impactos anticompetitivos. À autarquia, chegam relatos de exigência de exclusividade, alegações de retaliação e questionamentos sobre transparência nas políticas de visibilidade dentro das plataformas.
A atenção do Cade é reforçada pelo histórico de acordos firmados entre o conselho e o iFood. Tais compromissos preveem, por exemplo, limites para contratos exclusivos com restaurantes. A entrada de novas empresas muda o equilíbrio do setor e amplia a necessidade de supervisão regulatória.
Contratos de exclusividade e alegações de retaliação
No centro das controvérsias estão contratos de exclusividade assinados por restaurantes. Estabelecimentos que optaram por romper esses acordos relataram ter sido submetidos a medidas como inativação temporária de operações, perda de acesso a campanhas promocionais e redução da visibilidade nos resultados de busca do aplicativo. Em um caso judicializado, a rescisão contratual resultou em multa de R$ 1,2 milhão, valor posteriormente revisto pela Justiça para R$ 150 mil. A plataforma avalia que as sanções obedecem aos termos pactuados e sustentam que as condições foram homologadas pelo Cade.
Disputas em tribunal e vigilância sobre palavras-chave
A rivalidade também transborda para o campo jurídico. O iFood moveu ações para impedir que concorrentes, entre eles Rappi e 99, utilizem o nome da empresa como palavra-chave em anúncio patrocinado. Decisões favoráveis determinaram a interrupção dessa prática, sob o argumento de que o uso levaria o consumidor a erro ao buscar a marca na internet.
Outro front envolve suspeitas de espionagem corporativa. A Polícia Civil apura denúncias de que pessoas portando crachás falsificados teriam acessado sistemas internos de restaurantes parceiros da plataforma Keeta, com a finalidade de obter dados de negócio considerados estratégicos. A investigação segue em curso.
Posicionamento da 99Food
Enquanto isso, a 99Food afirma adotar um modelo que devolve poder de escolha aos restaurantes, com taxas reduzidas e contratos considerados mais flexíveis. Tal discurso busca atrair estabelecimentos que demonstram resistência a cláusulas de exclusividade e procuram alcançar uma base de usuários mais ampla por meio de múltiplos aplicativos.
Implicações para usuários, restaurantes e motoristas
A parceria iFood–Uber traz reflexos para diferentes elos da cadeia. Para o usuário final, a principal mudança é a simplificação: a possibilidade de alternar entre pedir comida e solicitar transporte dentro de uma única interface. Restaurantes podem se beneficiar de maior alcance caso a integração amplie a exposição das ofertas; ao mesmo tempo, permanecem atentos a eventuais políticas de ranking e promoção. Motoristas e entregadores, por sua vez, ganham novas fontes de demanda: corridas geradas no app de delivery e entregas provenientes do app de mobilidade.
As empresas afirmam que os modelos de remuneração de entregadores e motoristas seguem inalterados no curto prazo. No entanto, especialistas do setor preveem que o aumento do volume de transações poderá pressionar a adoção de ajustes futuros, seja em tarifas, seja em incentivos.
Próximos passos
Com a integração iniciada e o plano de assinatura lançado, o cronograma das companhias se concentra em assegurar estabilidade operacional, escalar o serviço para novas cidades dentro do calendário previsto e monitorar métricas de adesão. O desempenho em Belo Horizonte servirá de termômetro para ajustes na experiência de usuário, na precificação de cupons e na orquestração logística.
Em meio a investigações regulatórias, novidades competitivas e litígios judiciais, iFood e Uber avançam em uma aliança que, se bem-sucedida, poderá redefinir a forma como brasileiros combinam mobilidade urbana e consumo de refeições por aplicativo.

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