Governo cria Sistema Nacional para governança de Inteligência Artificial em novo projeto de lei

governança de Inteligência Artificial passa a ganhar contornos institucionais no Brasil após o governo federal encaminhar, em edição extra do Diário Oficial da União, um projeto de lei que institui o Sistema Nacional para Desenvolvimento, Regulação e Governança de Inteligência Artificial (SIA). A proposta, oficializada na segunda-feira (8) e assinada pelos ministros Esther Dweck, Ricardo Lewandowski e Sidônio Palmeira, define novas instâncias de coordenação, atribui à Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD) a função de autoridade central e procura assegurar uma estrutura jurídica sólida para o uso e o desenvolvimento de IA em todo o território nacional.
- Objetivos centrais do Sistema Nacional de governança de Inteligência Artificial
- Estrutura do projeto de lei e papel da ANPD na governança de Inteligência Artificial
- Comitês e Conselho previstos para a nova governança de Inteligência Artificial
- Correção de falhas constitucionais do PL 2338/2023
- Próximos passos na tramitação do marco de governança de Inteligência Artificial
Objetivos centrais do Sistema Nacional de governança de Inteligência Artificial
O projeto de lei enviado pelo Executivo descreve o SIA como um arranjo voltado a organizar, supervisionar e estimular iniciativas relacionadas ao emprego de sistemas de IA. De acordo com o texto, a ambição é estabelecer uma regulação “mais coordenada e segura”, integrando fiscalização, cooperação institucional e participação social. Além de fixar parâmetros técnicos, o SIA pretende transformar a IA em vetor de inovação estratégica, catalisador de desenvolvimento econômico, plataforma de inclusão social e instrumento de soberania digital. Esses quatro eixos são apresentados como diretrizes que nortearão políticas públicas, atividades empresariais e iniciativas acadêmicas vinculadas à inteligência artificial.
Para cumprir tais metas, a proposta concentra-se no “quem faz o quê” dentro da administração pública. Ao dedicar papéis específicos a cada órgão, o governo busca evitar a sobreposição de competências, promover eficiência administrativa e, em última instância, garantir segurança jurídica aos agentes que produzem ou utilizam tecnologias baseadas em IA. Essa clareza institucional é apontada como condição para que empresas inovem, pesquisadores avancem em descobertas e usuários se sintam protegidos contra riscos potenciais.
Estrutura do projeto de lei e papel da ANPD na governança de Inteligência Artificial
O texto estabelece a ANPD como órgão de referência para governança de Inteligência Artificial. Atualmente responsável pela Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, a agência passa a deter a atribuição de editar normas gerais, fiscalizar condutas e regulamentar segmentos ainda não contemplados por regras específicas no domínio da IA. A centralização dessas funções na ANPD procura assegurar uniformidade regulatória, reduzindo lacunas que poderiam surgir em áreas sem legislação própria.
Na prática, as competências da ANPD abrangerão: interpretação de princípios gerais, edição de regulamentos setoriais, aplicação de sanções administrativas e orientação a órgãos públicos que lidem com IA. O projeto também prevê que a agência atue de forma articulada com as demais instâncias recém-criadas, de modo a manter coerência entre políticas públicas, padrões técnicos e diretrizes éticas. A aposta é que a experiência acumulada pela ANPD em dados pessoais sirva de base para lidar com desafios semelhantes presentes nos sistemas de inteligência artificial, como transparência de algoritmos e mitigação de vieses.
Comitês e Conselho previstos para a nova governança de Inteligência Artificial
Três órgãos colegiados complementam a arquitetura institucional concebida pelo Executivo. Cada um cumpre funções distintas, mas interligadas, dentro do SIA:
Comitê de Regulação e Inovação em Inteligência Artificial (Cria) – Formado por representantes do setor produtivo, por usuários de tecnologias de IA e por pessoas potencialmente afetadas por suas aplicações, o Cria tem a missão de articular interesses diversos. O colegiado funcionará como espaço de diálogo, trazendo para a mesa de decisões os pontos de vista de quem desenvolve, contrata ou sente os efeitos dos sistemas inteligentes.
Comitê de Especialistas e Cientistas de Inteligência Artificial (Cecia) – Integrado por profissionais de notório saber ou experiência na área, esse comitê dispõe de independência frente aos segmentos regulados. Seus integrantes oferecerão subsídios técnicos, avaliarão tendências tecnológicas e identificarão riscos emergentes, contribuindo para que as propostas normativas mantenham aderência a padrões internacionais e acompanhem a evolução científica.
Conselho Brasileiro de Inteligência Artificial (CBIA) – Inspirado em conselhos estratégicos já utilizados em áreas como economia, o CBIA estabelecerá diretrizes e políticas nacionais para IA. O colegiado contará com a presença de até cinco ministérios, a serem definidos em regulamento, além da própria ANPD. A pluralidade ministerial permitirá que decisões considerem perspectivas de diferentes setores da administração pública, conectando temas como desenvolvimento econômico, segurança pública, comunicação social e inovação.
Ao combinar esses três fóruns – voltados, respectivamente, a interlocução com a sociedade, suporte científico e formulação de políticas – o governo aposta em uma engrenagem de checagem cruzada. Cada órgão, ao exercer seu mandato, tende a reforçar a legitimidade dos demais e a produzir um conjunto de normas mais equilibrado.
Correção de falhas constitucionais do PL 2338/2023
Além de criar o SIA, o novo projeto soluciona um impasse jurídico identificado no PL 2338/2023, texto que institui o Marco Regulatório de Inteligência Artificial no Brasil. O governo enxergou no projeto anterior um vício de iniciativa, já que a organização de órgãos da administração pública é matéria de competência privativa do Poder Executivo. Tal incongruência suscitava dúvidas sobre a constitucionalidade do marco regulatório.
Para corrigir o problema, a atual proposta reafirma que a estrutura de governança pertence ao Executivo e a detalha de modo a se harmonizar com o que estabelece a Constituição. Dessa forma, a tramitação legislativa deixa de enfrentar questionamentos formais relacionados à origem do texto e passa a concentrar-se no mérito das medidas apresentadas. O ajuste, portanto, não altera o conteúdo programático essencial do marco; apenas alinha a iniciativa à exigência constitucional, viabilizando sua continuidade no Congresso.
Próximos passos na tramitação do marco de governança de Inteligência Artificial
O Executivo indicou que o conteúdo recém-proposto será incorporado ao PL 2338/2023, já aprovado pelo Senado em dezembro de 2024. A expectativa é de que a compatibilização entre o texto original e a nova contribuição acelere a análise na Câmara dos Deputados. Caso o legislativo mantenha o ritmo, o Brasil poderá contar, em breve, com um marco legal robusto para inteligência artificial, apoiado em uma estrutura de governança definida, órgãos fiscalizadores estabelecidos e parâmetros claros para o desenvolvimento responsável da tecnologia.

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