Um ano após o arranque do Smart Sampa, sistema de videovigilância com reconhecimento facial instalado na cidade de São Paulo, um estudo independente conclui que a tecnologia não alterou os principais indicadores de criminalidade. O programa, que envolve mais de 30 mil câmaras e um investimento mensal próximo dos 10 milhões de reais, foi lançado em 2024 com a promessa de transformar a segurança pública da capital paulista.
Estudo não encontra impacto estatístico
A análise foi conduzida pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC). Utilizando o método estatístico Diferença em Diferenças, os investigadores compararam os índices criminais de São Paulo com os de outras cidades do estado que não adotaram o reconhecimento facial. Os resultados mostram:
- Leve aumento nos furtos, sem significância estatística;
- Taxas de homicídios e assaltos estáveis;
- Sem variação relevante nas detenções em flagrante ou por mandado judicial.
Para Thallita Lima, coordenadora de pesquisa do CESeC, “não há qualquer evidência de impacto na redução da criminalidade nem no aumento de prisões” após mais de um ano de funcionamento do Smart Sampa.
O relatório também aponta erros de identificação registados nos primeiros meses de 2025. Entre os casos relatados, um militar fardado foi confundido com um suspeito procurado, um jardineiro voluntário acabou detido injustamente e uma mulher grávida sofreu parto prematuro após ser identificada de forma errónea. Segundo os autores, falhas algorítmicas — que afetam sobretudo pessoas negras — e bases de dados desatualizadas explicam os enganos.
Destinação de recursos em debate
Os investigadores defendem que os recursos aplicados na tecnologia poderiam ser redireccionados para iniciativas com eficácia comprovada. Entre as alternativas sugeridas estão o reforço do policiamento comunitário, programas de prevenção em bairros vulneráveis, urbanismo social, políticas de juventude e melhoria da iluminação pública.
Prefeitura contesta conclusões
A administração municipal discorda dos resultados. De acordo com a prefeitura, as câmaras contribuíram para:
- 2 965 prisões em flagrante;
- 1 558 capturas de foragidos da Justiça;
- Localização de 79 pessoas desaparecidas.
As autoridades argumentam ainda que a metodologia do CESeC comparou realidades socioeconómicas distintas — a capital e cidades do interior — o que, na sua visão, distorce a avaliação.
Investigadores mantêm posição
Em resposta, o CESeC sublinha que os números apresentados pela prefeitura reflectem a actividade policial habitual e não comprovam efeito directo do reconhecimento facial. O centro reforça que a técnica estatística usada é amplamente aceite em avaliações de políticas públicas e garante que a comparação com cidades sem o programa permite isolar o impacto do Smart Sampa.
O debate sobre a eficácia do reconhecimento facial em segurança pública permanece, enquanto São Paulo continua a operar uma das maiores redes do género na América Latina. Nos próximos meses, novos dados poderão esclarecer se a tecnologia justifica o elevado investimento ou se serão necessárias alternativas para alcançar os resultados prometidos.

Imagem: reprodução via olhardigital.com.br