Detector de 3 kg capta neutrinos e abre caminho a nova geração de experiências
Uma equipa internacional demonstrou que é possível detetar neutrinos com um dispositivo de apenas 3 kg instalado a pouco mais de 20 metros de um reator nuclear. O ensaio, descrito num artigo da revista Nature, valida uma abordagem que contrasta com os tradicionais tanques de água ou gelo de milhares de toneladas, até agora considerados indispensáveis para observar estas partículas elusivas.
Detector compacto substitui tanques gigantes
Os neutrinos, frequentemente apelidados de “partículas-fantasma”, atravessam praticamente toda a matéria sem interagir. Por essa razão, experiências anteriores recorreram a infraestruturas colossais, como o IceCube, na Antártida, ou o HyperKamiokande, no Japão, onde volumes gigantes de água ou gelo aguardam um raro clarão resultante de um impacto entre um neutrino energético e um átomo.
No novo ensaio, designado CONUS+, os investigadores empregaram um cristal de germânio de 3 kg para medir interações com antineutrinos – a variante “espelho” do neutrino. O sensor foi colocado a 20,7 m do reator da central nuclear de Leibstadt, na Suíça, e permaneceu ativo durante 119 dias. Nesse período registou 395 eventos, valor em linha com as previsões teóricas para o fluxo de antineutrinos emitido pelo reator.
O segredo está num processo designado CEvNS (Espalhamento Elástico Coerente Neutrino-Núcleo). Em vez de colidir apenas com um protão ou neutrão, o neutrino transfere parte da sua energia para o núcleo completo do átomo, gerando um recuo extremamente pequeno mas detectável com eletrónica de alta precisão. Esta técnica dispensa volumes maciços de líquido, reduz custos e facilita a instalação de equipamentos perto de fontes de neutrinos.
Resultados validam sensibilidade do método
Os 395 sinais recolhidos representam uma das medições mais claras do processo CEvNS num ambiente junto a um reator comercial. Um dos autores, Christian Buck, do Instituto Max Planck de Física Nuclear, salientou que o resultado comprova “a sensibilidade do CONUS+ e a viabilidade de detetar o espalhamento de antineutrinos em núcleos atómicos” com tecnologia compacta.
Além de confirmar a teoria, o dispositivo mostrou capacidade para operar em condições reais, longe das câmaras subterrâneas habitualmente usadas para filtrar radiação de fundo. A proximidade ao reator aumenta o número de partículas observadas, compensando a dimensão reduzida do sensor.
Impacto na física, segurança nuclear e astrofísica
A simplificação dos sistemas de deteção pode alterar profundamente a investigação em física de partículas. Equipamentos leves permitem montar múltiplos postos de medição em locais antes impraticáveis, melhorar estatísticas e comparar fluxos de neutrinos provenientes de diferentes fontes, como reatores, aceleradores ou fenómenos cósmicos.
Na área da segurança nuclear, sensores baseados em CEvNS podem funcionar como monitores independentes de reatores, fornecendo dados em tempo real sobre a potência ou sobre eventuais desvios de material físsil, sem necessidade de acesso físico ao interior das instalações.
A astrofísica é outro domínio beneficiado. Detectores portáteis podem ser distribuídos em diferentes pontos do globo para captar neutrinos gerados por supernovas ou outros eventos celestes, aumentando a cobertura geográfica e a probabilidade de deteção simultânea.
Próximos passos
Os autores do estudo planeiam melhorar a resolução do equipamento e reduzir ainda mais o ruído de fundo. A meta passa por alcançar sensibilidades que permitam medir neutrinos de baixa energia produzidos pelo Sol ou pelo interior da Terra, fenómenos atualmente fora do alcance dos detetores compactos.
Se essas melhorias se confirmarem, a tecnologia CEvNS poderá tornar-se um padrão na observação de neutrinos, democratizando o acesso a esta área da física e abrindo novas janelas para compreender alguns dos componentes mais abundantes, mas menos compreendidos, do Universo.

Imagem: Kakteen Shutterstock via olhardigital.com.br