Defesa celular contra a Covid-19: Unifesp desvenda mecanismo do SARS-CoV-2 que altera o RNA pulmonar

Pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) identificaram um mecanismo pelo qual o SARS-CoV-2 enfraquece a defesa celular contra a Covid-19. O estudo, publicado na revista NAR Molecular Medicine com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), demonstra que o vírus altera estruturas-chave do RNA em células pulmonares logo após a infecção, reduzindo a eficácia das primeiras respostas antivirais do organismo.
- Quem está por trás da descoberta da defesa celular contra a Covid-19
- O que o estudo encontrou sobre a defesa celular contra a Covid-19
- Quando e onde as análises sobre a defesa celular contra a Covid-19 foram conduzidas
- Como o SARS-CoV-2 sabota a defesa celular contra a Covid-19
- Por que compreender a defesa celular contra a Covid-19 pode guiar novos tratamentos
- Próximos passos na validação do impacto sobre a defesa celular contra a Covid-19
Quem está por trás da descoberta da defesa celular contra a Covid-19
A investigação foi conduzida por um grupo multidisciplinar da Unifesp liderado pelo pesquisador Marcelo Briones. A equipe contou com financiamento da FAPESP e utilizou instalações de sequenciamento avançado pertencentes à universidade. O trabalho reflete o esforço contínuo da instituição em compreender os fatores que tornam o SARS-CoV-2 um agente altamente agressivo, com o objetivo declarado de subsidiar futuras intervenções terapêuticas e vacinais.
De acordo com os autores, a pandemia trouxe a necessidade de decifrar não apenas como o vírus penetra na célula humana, mas também o que ocorre nos momentos seguintes à invasão. Esse enfoque pós-entrada motivou a análise do RNA celular, campo em que o grupo já possuía experiência anterior.
O que o estudo encontrou sobre a defesa celular contra a Covid-19
Os cientistas verificaram que o SARS-CoV-2 estabelece ligações rápidas com moléculas conhecidas como lncRNAs (long non-coding RNAs). Em situações normais, esses lncRNAs — entre eles UCA1, GAS5 e NORAD — regulam a produção de interferon, proteína central para a contenção inicial de vírus. A investigação revelou que o patógeno reduz o tempo de interação desses lncRNAs com seus alvos, efeito que prejudica a cascata imunológica de alerta.
O fenômeno é impulsionado por uma modificação química específica, a N6-metiladenosina (m6A). Essa metilação altera a geometria do RNA e enfraquece estruturas de fita dupla responsáveis pela estabilidade das moléculas. Com o emparelhamento comprometido, o sinal que normalmente leva à produção de interferon fica atrasado ou atenuado, dando vantagem ao vírus nos primeiros instantes da infecção.
Quando e onde as análises sobre a defesa celular contra a Covid-19 foram conduzidas
As amostras analisadas provêm de culturas de células pulmonares infectadas em laboratório. O sequenciamento ocorreu no período recente da pandemia, quando as restrições sanitárias permitiram atividades presenciais controladas nos campus da Unifesp. Para mapear as alterações em tempo real, a equipe recorreu à plataforma Oxford Nanopore, tecnologia capaz de ler fragmentos longos de RNA enquanto estes atravessam um nanoporo de proteína. A medida das variações elétricas durante a passagem permite detectar não só a sequência, mas também modificações químicas como a m6A.
A combinação de sequenciamento contínuo com análise de aprendizado de máquina possibilitou quantificar o aumento da metilação em células infectadas. Esse conjunto de dados foi cruzado com softwares de modelagem estrutural de RNA, confirmando que as mudanças ocorrem em regiões cruciais para a atuação dos lncRNAs.
Como o SARS-CoV-2 sabota a defesa celular contra a Covid-19
A ação do vírus pode ser decomposta em etapas interligadas:
1. Exposição do RNA viral: Assim que penetra na célula pulmonar, o SARS-CoV-2 libera seu RNA no citoplasma, possibilitando interações imediatas com componentes celulares.
2. Conexão com lncRNAs: O genoma viral aproxima-se de lncRNAs reguladores da resposta imune. Essa proximidade altera a dinâmica normal dessas moléculas.
3. Indução de metilação m6A: Enzimas celulares, influenciadas pela presença do RNA viral, adicionam grupos metil ao nucleotídeo adenina em pontos específicos. A modificação desestabiliza as estruturas de dupla fita, favorecendo emparelhamentos alternativos (tipo Hoogsteen) que prejudicam a sinalização.
4. Redução do tempo de ligação: Com a estabilidade comprometida, lncRNAs como UCA1, GAS5 e NORAD permanecem menos tempo ancorados aos seus alvos. Isso diminui a eficiência da ativação do interferon.
5. Vantagem inicial do vírus: A defesa celular torna-se mais lenta, permitindo ao patógeno replicar-se antes que o sistema imune montado pelo hospedeiro possa reagir de forma plena.
Por que compreender a defesa celular contra a Covid-19 pode guiar novos tratamentos
Conhecer em detalhe o mecanismo descrito oferece duas frentes potenciais de aplicação. A primeira está no desenvolvimento de antivirais capazes de bloquear ou reverter a metilação m6A em lncRNAs críticos, restaurando a sinalização do interferon. A segunda envolve a formulação de vacinas que considerem não só a neutralização de proteínas virais, mas também a inibição dos processos que alteram o RNA do hospedeiro.
Os autores destacam que investigar a metilação abre caminho para biomarcadores de gravidade. Se níveis elevados de m6A em determinados lncRNAs forem detectáveis em amostras clínicas, profissionais de saúde poderão avaliar precocemente o risco de progressão da doença e intervir com terapias direcionadas.
Próximos passos na validação do impacto sobre a defesa celular contra a Covid-19
Com o sequenciamento e a modelagem estrutural concluídos, a Unifesp inicia agora ensaios de bancada para confirmar a relação causal entre metilação, instabilidade dos lncRNAs e redução na produção de interferon. As experiências incluem a exposição de culturas celulares a inibidores de metiltransferase para observar se a restauração da estabilidade do RNA melhora a resposta antiviral. Resultados desses testes laboratoriais serão fundamentais para comprovar se a reversão da m6A é capaz de restabelecer a defesa celular nos estágios iniciais da infecção.
O avanço para essa fase experimental marca o próximo ponto de observação para a comunidade científica, que aguarda a confirmação dos efeitos descritos e sua possível tradução em estratégias terapêuticas.

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