Nove mulheres que dizem ter sido abusadas por Jeffrey Epstein reuniram-se esta quarta-feira nos degraus do Capitólio dos Estados Unidos para exigir a publicação integral dos documentos do inquérito federal e para anunciar a criação de uma lista confidencial de pessoas que, alegadamente, facilitaram ou participaram nos crimes do financista.
Testemunhos públicos no Capitólio
Lisa Phillips, uma das sobreviventes, disse que as vítimas “compilarão em sigilo os nomes que todos conhecemos e que frequentavam o universo de Epstein”, sublinhando que a iniciativa é “feita por sobreviventes e para sobreviventes”. Durante a conferência de duas horas, as intervenientes descreveram episódios de abuso sexual ocorridos quando eram menores. Marina Lacerda relatou ter começado a trabalhar para Epstein aos 14 anos em Nova Iorque, onde, segundo contou, passou de “emprego de sonho” a “pior pesadelo” até ser considerada “demasiado velha” aos 17 anos.
Annie Farmer recordou ter sido levada para o Novo México, aos 16 anos, num fim de semana organizado por Epstein. A irmã, que também viajou, denunciou o caso às autoridades na época, mas afirmou que nada foi feito. Chauntae Davies referiu-se à amizade entre Epstein e Donald Trump, dizendo que o arguido “gostava de exibir” uma fotografia com o ex-presidente na secretária.
Pressão para libertar 100 000 páginas
O encontro foi promovido por dois congressistas — o republicano Thomas Massie (Kentucky) e o democrata Ro Khanna (Califórnia) — que recolhem assinaturas para forçar uma votação destinada a obrigar o Departamento de Justiça (DoJ) a divulgar todos os ficheiros relacionados com o caso. Para que a proposta avance, são necessárias 218 subscrições, incluindo pelo menos seis republicanos.
Na véspera do evento, o Comité de Supervisão da Câmara publicou 33 000 páginas e vários vídeos provenientes do DoJ e da herança de Epstein. Contudo, o democrata Robert Garcia afirmou que 97 % desse material já era público e que os novos documentos “não contêm qualquer lista de clientes nem promovem a transparência devida às vítimas”. Estima-se que o DoJ detenha cerca de 100 000 páginas sobre o processo.
Phillips apelou ao departamento para libertar todos os registos, indicando que muitas vítimas “temem represálias” se divulgarem os nomes por iniciativa própria. Um advogado presente acrescentou que as mulheres receiam ser processadas ou alvo de ataques, “porque ninguém as protegeu da primeira vez”.
Divisão política e reacções de Trump
A Casa Branca e a liderança republicana no Congresso opõem-se à divulgação total dos documentos, invocando o risco de expor pessoas inocentes. Questionado sobre o assunto no Salão Oval, Donald Trump classificou o movimento como “um embuste democrata que nunca acaba” e afirmou que “ninguém fica satisfeito” com as informações já tornadas públicas. “Penso que chega”, declarou.
Os congressistas defensores da publicação integral consideram, porém, que a resistência protege “perpetradores ricos e poderosos”. Massie qualificou como “vergonhoso” o rótulo de embuste. “Existem vítimas reais neste esquema de tráfico sexual”, frisou.
Entretanto, a audiência pública reforçou o carácter não partidário das reivindicações. Liz Stein, que processou Epstein e Ghislaine Maxwell e hoje acompanha outras vítimas, afirmou à BBC que o objectivo é “humanizar os sobreviventes” e recordar que “se trata de um crime de tráfico sexual, não de uma questão política”.
Nos últimos meses, parte das provas foi libertada, incluindo a transcrição, com 300 páginas, de um interrogatório a Ghislaine Maxwell, já condenada como cúmplice de Epstein. Nos depoimentos, Maxwell reconheceu ter visto Trump e Epstein em eventos sociais, mas negou que fossem amigos próximos.
À medida que a pressão cresce dentro e fora do Congresso, as vítimas afirmam manter-se unidas na procura de justiça. A lista confidencial que começou a ser elaborada deverá incluir nomes de associados, funcionários e convidados frequentes das propriedades de Epstein, embora só seja tornada pública caso as autoridades não avancem com a divulgação completa dos registos oficiais.
Para já, o Departamento de Justiça não comentou o pedido. Enquanto isso, os sobreviventes insistem que a transparência total é essencial para responsabilizar todos os envolvidos e prevenir novos casos de abuso.