Resíduos de lítio fortalecem o concreto e diminuem emissões na construção civil

Pesquisadores da Universidade Flinders, na Austrália, demonstraram que um subproduto da mineração de lítio, o β-espodumênio delitiado (DβS), pode transformar radicalmente a composição do concreto ao mesmo tempo em que reduz impactos ambientais associados à construção civil, responsável por aproximadamente 8 % das emissões globais de gases de efeito estufa.
- Quem conduz o estudo
- O que foi descoberto
- Quando e onde os testes ocorreram
- Como o DβS atua no concreto
- Por que a descoberta é relevante
- Impactos ambientais mitigados
- Detalhamento dos resultados experimentais
- Comparação com concreto convencional
- Indústria de lítio e escalabilidade
- Vantagens econômicas potenciais
- Continuidade das pesquisas
- Perspectivas para a construção civil
Quem conduz o estudo
A iniciativa é liderada por uma equipe de engenheiros estruturais da Universidade Flinders. À frente dos experimentos está o Dr. Aliakbar Gholampur, cujo histórico de pesquisa inclui o uso de geopolímeros reforçados com fibras naturais e areias derivadas de resíduos. Esse grupo científico tem se dedicado a encontrar soluções que reforcem estruturas de concreto sem recorrer a insumos de alto impacto ambiental.
O que foi descoberto
O núcleo da descoberta é a incorporação do DβS como agente aglomerante em misturas de concreto. Tradicionalmente, a indústria emprega cinzas volantes — resíduo da queima de carvão — para esse papel. Contudo, o fechamento gradual de usinas termelétricas vem reduzindo a disponibilidade desse material. Ao substituir parte das cinzas volantes por DβS, os pesquisadores obtiveram dois resultados principais:
1. Aumento de resistência mecânica. Com 25 % de cinzas volantes substituídas por DβS, a resistência à compressão subiu 34 % em comparação ao concreto que utilizava 100 % de cinzas volantes.
2. Ganho adicional ao otimizar a solução alcalina. Ajustando a proporção da substância ativadora, o incremento de resistência atingiu 74 %.
Esses números indicam que o DβS não apenas supri a escassez de cinzas volantes, mas supera seu desempenho, gerando um produto final mais robusto.
Quando e onde os testes ocorreram
Os experimentos foram conduzidos em laboratórios da Universidade Flinders, na Austrália. Após a moldagem dos corpos de prova, as amostras passaram por um ciclo de 28 dias de cura, período padrão para avaliar a evolução da resistência de concreto. Ao término desse intervalo, análises revelaram uma estrutura interna mais densa e menos permeável, fatores decisivos na proteção contra corrosão de armaduras metálicas.
Como o DβS atua no concreto
O β-espodumênio delitiado é um resíduo gerado durante o refino do lítio. Quando introduzido na mistura, ele reage quimicamente dentro da matriz cimentícia, atuando como componente ligante. Essa reação:
• Reduz a porosidade, dificultando a penetração de água e agentes agressivos.
• Aumenta a resistência à compressão, conferindo maior capacidade de suportar cargas.
• Eleva a durabilidade, já que a menor permeabilidade mitiga processos de corrosão e fadiga.
Por que a descoberta é relevante
A produção convencional de concreto depende fortemente de cimento Portland, cuja fabricação emite grandes quantidades de dióxido de carbono. Além disso, o setor consome extensivamente areia, brita e água. Ao aproveitar um resíduo que até então era classificado como perigoso, o estudo cumpre dupla função ambiental:
• Redução das emissões associadas ao cimento. Parte do ligante tradicional é substituída por DβS, diminuindo a pegada de carbono da mistura.
• Desvio de resíduos de aterros. O β-espodumênio delitiado, hoje descartado, passa a integrar um ciclo produtivo, alinhando-se aos princípios da economia circular.
Impactos ambientais mitigados
Segundo os autores, a adoção do DβS representa uma forma de evitar a contaminação de solo e águas subterrâneas que poderia ocorrer com o acúmulo desse resíduo. Ao mesmo tempo, a substituição parcial das cinzas volantes cumpre um papel crucial, já que a oferta desse resíduo do carvão diminui à medida que fontes de energia mais limpas ganham espaço.
Detalhamento dos resultados experimentais
A equipe realizou várias formulações até chegar à proporção considerada ideal. Os principais parâmetros avaliados foram:
• Proporção DβS/cinzas volantes: a substituição de um quarto das cinzas gerou o equilíbrio necessário entre desempenho e trabalhabilidade da mistura.
• Composição da solução alcalina: ajustes nesse componente catalisaram reações internas que maximizaram a formação de ligações químicas, resultando no salto de 74 % em resistência.
• Cura em 28 dias: após esse período, observou-se densificação microestrutural e menor incidência de microfissuras, fatores diretamente ligados à durabilidade de longo prazo.
Comparação com concreto convencional
Quando os valores obtidos com DβS foram confrontados com os de concretos tradicionais à base de cimento Portland, a durabilidade se mostrou equivalente. A diferença principal residiu no menor impacto ambiental, uma vez que parte do ligante de alta emissão foi substituída por resíduo industrial.
Indústria de lítio e escalabilidade
Com a expansão global da mineração de lítio destinada a baterias de veículos elétricos e dispositivos eletrônicos, projeta-se um volume crescente de DβS. O estudo sugere que esse fluxo de resíduo poderia ser direcionado às usinas de concreto, criando um elo entre dois setores estratégicos: mineração e construção.
Vantagens econômicas potenciais
Ainda que o trabalho se concentre na parte técnica, os pesquisadores ressaltam que o reaproveitamento de resíduos costuma reduzir custos de descarte industrial. Dessa forma, empresas de mineração poderiam minimizar despesas ambientais, enquanto concreteiras se beneficiariam de um material de alto desempenho disponível em larga escala.
Continuidade das pesquisas
O estudo reforça linhas de investigação anteriores do mesmo grupo, que já haviam testado fibras naturais e areias derivadas de resíduos em geopolímeros. As evidências obtidas com o DβS indicam um caminho promissor para misturas cimentícias modernas, caracterizadas por elevada resistência, durabilidade e menor pegada de carbono.
Perspectivas para a construção civil
A descoberta se soma a um conjunto de abordagens que buscam descarbonizar a construção, o material mais produzido do planeta. Ao transformar um resíduo perigoso em insumo valioso, a pesquisa demonstra que é possível compatibilizar demanda por infraestrutura, segurança estrutural e responsabilidade ambiental.
O avanço obtido pela Universidade Flinders ilustra como soluções baseadas em economia circular podem redefinir fluxos de materiais. Se adotado em escala industrial, o uso de DβS deverá contribuir para reduzir emissões associadas ao cimento, evitar descarte tóxico e ampliar a vida útil das estruturas, favorecendo práticas sustentáveis em uma das cadeias produtivas mais intensivas do mundo.

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