Milhares de reservistas começaram a apresentar-se ao serviço, respondendo à convocatória das Forças de Defesa de Israel (IDF) para a fase seguinte da operação terrestre em Gaza. A mobilização coincide com o avanço das tropas nos arredores de Gaza City, centro urbano que o exército considera um bastião do Hamas.
Nova vaga de mobilização
Segundo um responsável militar israelita, “milhares” de reservistas compareceram esta terça-feira aos quartéis. Em maio, o exército já tinha anunciado a chamada de cerca de 60 000 militares na reserva para a “Operação Gideon’s Chariots II”, prolongando ainda o serviço de mais 20 000 que permanecem mobilizados. A imprensa local refere que parte destes efectivos será destacada para a Cisjordânia ocupada e para o norte de Israel, libertando pessoal permanente para a frente de combate em Gaza.
Algumas unidades de combate registam, contudo, menor adesão do que em convocações anteriores. Reservistas que acumularam várias missões nos 22 meses de conflito alegam motivos pessoais ou financeiros para solicitar dispensa.
Objectivos militares e tensões políticas
O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu reiterou que a ofensiva pretende “conquistar toda a Faixa de Gaza, derrotar o Hamas e libertar todos os reféns”. A organização mantém 48 pessoas cativas, das quais 20 são dadas como vivas. As famílias receiam que a pressão militar ponha em risco os prisioneiros e exigem um acordo negociado.
O chefe do Estado-Maior, tenente-general Eyal Zamir, defendeu recentemente uma proposta dos mediadores regionais que prevê a libertação de metade dos reféns durante uma trégua de 60 dias. Netanyahu insiste num entendimento global que inclua a rendição armada do Hamas e a libertação total dos cativos. Fontes governamentais relataram discussões acaloradas entre Zamir e membros do gabinete de segurança, com o general a advertir que o plano para Gaza City pode comprometer os reféns e obrigar Israel a instaurar um governo militar na cidade.
Em discurso perante reservistas na base de Nachshonim, Zamir afirmou que o exército se prepara para “uma vitória decisiva” e vai “intensificar os ataques”, mantendo a operação até que o Hamas seja derrotado.
Situação no terreno
A artilharia e a aviação israelitas continuam a alvejar Gaza City. Autoridades hospitalares reportaram pelo menos 95 mortos desde a meia-noite de terça-feira, 35 dos quais deram entrada no hospital Al-Shifa. Os bombardeamentos atingiram os bairros de Tal al-Hawa, no sul, e Sheikh Radwan, no norte.
O exército ordenou a evacuação imediata da população para o sul do território. A ONU estima que apenas 20 000 pessoas tenham conseguido deslocar-se nas últimas duas semanas; perto de um milhão permanecem na cidade. Responsáveis humanitários alertam que uma ofensiva total terá consequências “além de catastróficas” para toda a Faixa de Gaza.
Crise humanitária agrava-se
Especialistas internacionais em segurança alimentar confirmaram que a fome instalou-se em Gaza City e poderá alastrar até Deir al-Balah e Khan Younis antes do final de setembro. A ONU descreve a situação como um “desastre provocado pelo homem” e lembra que Israel, potência ocupante de facto, tem obrigação de garantir o fornecimento de comida e meios médicos. Telavive nega restrições à ajuda e contesta os números divulgados pelo Ministério da Saúde de Gaza controlado pelo Hamas.
Nas zonas meridionais, os acampamentos de deslocados estão sobrelotados e os hospitais trabalham várias vezes acima da capacidade. O hospital Nasser, em Khan Younis, registou na terça-feira 31 óbitos, incluindo 13 vítimas de dois ataques em al-Mawasi e no campo local. Médicos relatam escassez de equipamentos e a avaria do tomógrafo, obrigando a tratamentos “às cegas”.
O Ministério da Saúde gazense assinalou 13 mortes por desnutrição nas 24 horas anteriores, elevando para 361 o total de óbitos desse tipo desde o início da guerra; 185 ocorreram em agosto. No conjunto do conflito, a mesma fonte contabiliza 63 633 mortos palestinianos.
Contexto do conflito
A ofensiva israelita começou após o ataque liderado pelo Hamas em 7 de outubro de 2023, que provocou cerca de 1 200 mortos em Israel e o rapto de 251 pessoas. Desde então, Israel apoderou-se de, pelo menos, 75 % da Faixa de Gaza, segundo estimativas militares.
As Nações Unidas avisam que forçar novos deslocamentos em massa “pode constituir transferência forçada”, prática considerada crime de guerra. Ao mesmo tempo, a comunidade internacional exige garantias para a assistência humanitária e pressiona ambas as partes a retomarem negociações que visem um cessar-fogo e a libertação dos reféns.