Receita aponta que desinformação sobre taxação do Pix facilitou lavagem de dinheiro do PCC
A Receita Federal identificou que a circulação de notícias falsas sobre uma alegada taxação do Pix contribuiu para manter ocultos esquemas de lavagem de dinheiro ligados ao Primeiro Comando da Capital (PCC). O entendimento foi divulgado após uma megaoperação da Polícia Federal que visou fintechs e outras empresas suspeitas de movimentar montantes ilícitos para a organização criminosa.
Como a desinformação travou a fiscalização
De acordo com a subsecretária de fiscalização da Receita, Andrea Costa Chaves, o boato de que transações via Pix seriam tributadas ganhou força nas redes sociais e acabou por pressionar o Governo a revogar normas que previam o envio de dados de determinadas movimentações financeiras ao órgão. Essas regras exigiam que:
• transferências iguais ou superiores a R$ 5 000 entre pessoas físicas;
• e operações a partir de R$ 15 000 realizadas por empresas
fossem comunicadas para análise.
Segundo Chaves, a revogação deixou mais de 200 fintechs fora do alcance direto da fiscalização, reduzindo a visibilidade sobre fluxos suspeitos e permitindo que parte do dinheiro da facção circulasse sem alertas automáticos.
Vídeo viral de deputado impulsionou o recuo
O deputado federal Nikolas Ferreira (PL) publicou um vídeo que associava o cruzamento de dados a uma futura cobrança sobre o Pix. O conteúdo alcançou cerca de 200 milhões de visualizações e reforçou a narrativa de que o Governo pretendia taxar as transferências instantâneas. Autoridades consideram essa ligação infundada e classificam o material como fake news.
Operação Carbono Oculto revela dimensão do esquema
Semanas antes da declaração da Receita, a Polícia Federal deflagrou a operação Carbono Oculto, que mobilizou cerca de 1 400 agentes em oito estados. O alvo principal eram redes de combustíveis e fintechs usadas para lavar dinheiro proveniente do tráfico. A investigação estima que o esquema movimentou R$ 7,6 mil milhões.
As empresas identificadas funcionavam como elo entre contas correntes convencionais e plataformas de pagamento digital, fragmentando valores para dificultar rastreios. Sem os relatórios automáticos de operações atípicas, o volume total só foi identificado após meses de apurações manuais.
Governo retoma exigência de relatórios
Diante dos resultados da operação, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, determinou a elaboração de uma nova norma que obriga fintechs e outras instituições de pagamento a reportar transações relevantes. A medida pretende recompor o fluxo de informações interrompido e acelerar a identificação de movimentações suspeitas.
Impacto para o sistema financeiro
Especialistas em combate ao crime financeiro alertam que a atuação de fintechs é essencial para a inclusão bancária, mas também pode ser explorada por redes criminosas quando os mecanismos de supervisão são fragilizados. A Receita afirma que a partilha de dados não implica cobrança adicional sobre o utilizador final do Pix, servindo unicamente para fiscalização.
Enquanto a nova regulamentação não entra em vigor, a Polícia Federal mantém investigações sobre as empresas sob suspeita, com foco nos responsáveis por autorizar transferências e na possível conivência de gestores. O Ministério Público avalia imputar acusações de lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Próximos passos
A Receita Federal planeia intensificar campanhas contra desinformação financeira e reforçar a cooperação com plataformas digitais para travar a propagação de conteúdos falsos. O órgão também estuda ampliar o uso de inteligência artificial para detetar padrões de transações que indiquem movimentação criminosa, independentemente do valor individual das operações.
Com as novas diretrizes, autoridades esperam reduzir o espaço de manobra de organizações como o PCC no sistema de pagamentos instantâneos, sem comprometer a agilidade que tornou o Pix uma das ferramentas de transferência mais populares do país.