Presa no mar por 188 dias, cozinheira relata o isolamento

Presa no mar por 188 dias, a cozinheira italiana Giulia Baccosi viu sua vida virar do avesso quando trocou um emprego em terra firme por uma vaga de última hora no veleiro cargueiro Avontuur, em 1º de janeiro de 2020.

A bordo da escuna de 100 anos, a missão parecia simples: cruzar o Atlântico levando rum e azeite da Europa para a América Central e, três meses depois, desembarcar no México. O plano durou pouco. Ao chegar a Tenerife, rumores de um vírus misterioso surgiram, mas nada indicava o que viria pela frente.

Presa no mar por 188 dias, cozinheira relata o isolamento

Já em alto-mar, o capitão leu um e-mail do proprietário do navio: “Portos e aeroportos estão fechando”. A pandemia de Covid-19 isolara o planeta, e o Avontuur ficou sem destino certo. A tripulação, composta por 15 pessoas, passou a receber apenas um e-mail diário via satélite, única ligação com o mundo exterior.

Sem poder atracar, o grupo enfrentou escalas negadas no Caribe, dificuldades para reabastecer e tensões crescentes no convés — espaço do tamanho de uma quadra de basquete. Giulia precisou racionar café, reinventar cardápios e até improvisar um fogão de cozimento lento dentro de uma caixa térmica feita de madeira, espuma expansiva e um tapete de ioga.

Momentos de alívio vieram com a natureza: golfinhos, peixes-voadores e uma noite mágica ao lado de baleias-minke em águas bioluminescentes. Também houve solidariedade: a 45 milhas de Gran Canária, o Avontuur resgatou 16 migrantes que flutuavam há dez dias sem água nem comida — episódio relatado depois pela BBC.

Desviando de um furacão e já com alimentos escassos, a embarcação subiu até a altura de Terra Nova, no Canadá, antes de rumar aos Açores. Somente em junho, após testes negativos para Covid, a tripulação pôde pisar em terra firme em Horta. “Queria sentir o cheiro das flores e escolher virar à esquerda ou à direita”, recorda Giulia.

No fim de julho de 2020, depois de atravessar 30 mil quilômetros, o Avontuur atracou em Hamburgo. Entre lágrimas, os marinheiros descarregaram 64 toneladas de mercadorias e celebraram a volta à Europa. “Retornei diferente”, resume Giulia, que hoje continua trabalhando em alto-mar, agora perto da Groenlândia.

Esta travessia extrema mostra como o confinamento, seja em casa ou num navio, redefine prioridades e fortalece laços humanos.

Para seguir acompanhando histórias de superação em tempos de incerteza, leia mais na editoria de Ciência e Tecnologia.

Crédito: Matthias Berg/Klima Segler

Posts Similares

Deixe uma resposta

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.