Estudo revela formações de gelo em Plutão tão altas como a Torre Eiffel
Um novo trabalho científico indica que grande parte da região equatorial de Plutão está coberta por agulhas de metano congelado com cerca de 300 metros de altura, dimensão comparável à Torre Eiffel, em Paris. A investigação, publicada na revista Journal of Geophysical Research: Planets, juntou dados visuais e infravermelhos obtidos pela sonda New Horizons para mapear terrenos que não tinham sido fotografados em alta resolução aquando da passagem da missão em 2015.
Descoberta assenta em imagens da missão New Horizons
Durante o sobrevoo de 2015, a New Horizons registou apenas o hemisfério que estava voltado para a nave. Nessas fotografias foram identificadas estruturas pontiagudas de gelo de metano, posteriormente catalogadas numa zona designada Tartarus Dorsa. Esses espinhos, ou penitentes, formam-se em altitudes elevadas, onde a sublimação do gelo modela o relevo em lâminas estreitas.
Para avaliar a existência das mesmas formações no lado não observado, os investigadores recorreram a medições de brilho captadas em várias frequências do infravermelho. A equipa comparou a rugosidade do terreno a partir das sombras projectadas e da forma como a luz se reflecte em superfícies irregulares. Os resultados indicam que cerca de 60 % da circunferência equatorial de Plutão exibe propriedades consistentes com estas estruturas geladas.
Modelo matemático confirma terreno duas vezes mais irregular
Com base num modelo que relaciona variações de iluminação com inclinação e altitude do relevo, concluiu-se que as áreas ricas em metano no hemisfério não fotografado são, em média, duas vezes mais rugosas do que o terreno analisado directamente pela nave. De acordo com o artigo, os espinhos deverão estender-se entre 30 graus a norte e 30 graus a sul do equador, intervalos onde a incidência solar favorece ciclos de sublimação e deposição de gelo de metano.
Ao contrário do azoto, predominante noutros pontos da superfície plutoniana, o metano congela e sublima a temperaturas mais elevadas, permitindo que estas formações se mantenham estáveis nas altitudes onde foram detectadas. A crista Tartarus Dorsa, situada a leste do terreno em forma de coração informalmente apelidado de Tombaugh Regio, é o exemplo mais evidente desse processo, mas a nova análise sugere que a mesma dinâmica ocorre ao longo de milhares de quilómetros.
Limitações e necessidade de nova missão
Apesar dos indícios robustos, os autores reconhecem que a confirmação definitiva só será possível com observações futuras de maior resolução. A ausência de uma segunda passagem da New Horizons impede a recolha de imagens directas do hemisfério oposto, e o material existente depende fortemente de técnicas de reconstrução matemática e fotometria.
Uma missão dedicada a Plutão ou à Cintura de Kuiper poderia fornecer medições topográficas detalhadas, espectroscopia de alta precisão e acompanhamento temporal das variações sazonais no planeta anão. Essas informações seriam cruciais para compreender não só a formação dos espinhos, mas também a evolução climática de Plutão desde a sua migração para a órbita actual.
Processo de formação dos «espinhos» plutonianos
Os penitentes observados noutros corpos, como certas planícies da Terra ou mesmo a superfície de Tritão, resultam da sublimação desigual de gelo exposto à radiação solar. Em Plutão, o processo é intensificado pela rarefacção da atmosfera e pela composição rica em metano. À medida que a luz aquece pontualmente a superfície, o gelo passa directamente do estado sólido para o gasoso, esculpindo cristas e torres que se tornam cada vez mais agudas.
A inclinação do eixo de Plutão, combinada com a sua órbita elíptica, cria condições extremas em termos de iluminação sazonal. Estas variações explicam a concentração das formações em determinado intervalo de latitudes, onde a insolação média ao longo do ano favorece a persistência do fenómeno.
Impacto para a compreensão de corpos gelados do Sistema Solar
A existência generalizada de agulhas de gelo de grande escala altera a interpretação da geologia de Plutão e pode oferecer pistas sobre processos semelhantes noutros objectos da Cintura de Kuiper. O estudo sugere que a presença de compostos voláteis, aliada a atmosferas muito ténues, desempenha um papel decisivo na modelação do relevo exterior aos planetas gigantes.
De forma mais ampla, as conclusões reforçam a importância de missões de reconhecimento rápido, como a New Horizons, para identificar fenómenos inesperados, e demonstram o potencial de análises posteriores baseadas em dados de arquivo. Mesmo sem imagens de alta resolução do hemisfério oculto, os investigadores conseguiram inferir características topográficas complexas, apontando o caminho para futuras explorações dos confins do Sistema Solar.

Imagem: NASA via olhardigital.com.br