Nagasaki assinala 80 anos da bomba atómica e apela ao fim dos conflitos
Nagasaki recordou hoje o 80.º aniversário do ataque nuclear de 9 de agosto de 1945 com uma cerimónia solene que reforçou o alerta para o risco de nova guerra atómica. O presidente da câmara, Shiro Suzuki, pediu o fim imediato dos conflitos em curso, avisando que a escalada de confrontos pode conduzir a uma catástrofe nuclear.
Memória viva da destruição
O bombardeamento norte-americano matou cerca de 74 000 pessoas e deixou milhares de sobreviventes a lutar, durante décadas, contra doenças associadas à radiação. O ato comemorativo começou com um minuto de silêncio, quebrado pelo toque simultâneo dos sinos das duas catedrais da cidade, algo inédito desde 1945. Em seguida, representantes de várias gerações depositaram oferendas de água, evocando as vítimas que, com a pele em chamas, imploravam por água nos instantes que se seguiram à explosão.
“Se continuarmos neste caminho, empurraremos a Humanidade para uma guerra nuclear”, declarou Suzuki na Declaração de Paz lida no Parque da Paz de Nagasaki. O autarca sublinhou que as hostilidades crescentes em várias regiões do globo alimentam um “ciclo vicioso de confronto e fragmentação”.
Testemunho dos sobreviventes
Entre os oradores esteve Hiroshi Nishioka, 93 anos, que se encontrava a três quilómetros do hipocentro quando tinha 13 anos. Lembrou que muitos dos que escaparam aos ferimentos imediatos “começaram a sangrar das gengivas e a perder cabelo antes de morrerem”, descrevendo o “terror invisível” provocado pela radiação mesmo após o fim da guerra.
Para a residente Atsuko Higuchi, de 50 anos, a cerimónia mantém viva a história. “É importante recordar que estes acontecimentos foram reais”, afirmou, destacando a necessidade de transmitir a memória às gerações mais jovens.
Participação internacional e contexto geopolítico
Ao contrário do ano anterior, Israel, bem como a Rússia e a Bielorrússia, receberam convites para a cerimónia. A decisão surge após a exclusão destes países em 2023 devido a questões de segurança e à invasão russa da Ucrânia, respetivamente. O gesto procura sublinhar a mensagem universal de paz, apesar das tensões que persistem em diferentes frentes, como a guerra na Ucrânia e o conflito entre Israel e o grupo Hamas em Gaza.
O debate sobre o desarmamento ganhou novo fôlego desde que o Tratado sobre a Proibição de Armas Nucleares entrou em vigor em 2021. Mais de 70 Estados ratificaram o acordo, mas as potências nucleares rejeitam-no, alegando que os arsenais atuam como fator de dissuasão. O Japão, aliado dos Estados Unidos, também não aderiu, mantendo-se sob o guarda-chuva nuclear norte-americano.
Comparação com Hiroshima
O memorial em Nagasaki acontece poucos dias depois da evocação da bomba lançada sobre Hiroshima, em 6 de agosto de 1945, que causou cerca de 140 000 mortes. Embora o engenho detonado em Nagasaki fosse mais potente, a topografia montanhosa da cidade limitou parcialmente a zona de destruição. Ainda assim, bairros inteiros foram reduzidos a cinzas em segundos.
Lições para o presente
A dupla tragédia das duas únicas utilizações de armas nucleares em combate continua a moldar o debate sobre segurança internacional. Perante a modernização dos arsenais e o aumento das tensões regionais, a mensagem proveniente de Nagasaki procura reforçar a urgência de soluções diplomáticas. As autoridades locais insistem que o sofrimento de 1945 deve servir de advertência contra o recurso à força como forma de resolver disputas.
O Programa das Nações Unidas para o Desarmamento sublinha que existem hoje mais de 12 000 ogivas atómicas no mundo, distribuídas por nove países. A simples possibilidade de erro de cálculo ou acidente mantém visível a ameaça de uma catástrofe global semelhante ou superior à de 1945.
Compromisso com a paz
Na parte final da cerimónia, crianças libertaram pombas brancas enquanto os participantes entoaram um apelo à coexistência pacífica. A cidade de Nagasaki reafirmou o compromisso de continuar a testemunhar contra as armas nucleares e a educar novas gerações sobre as consequências da guerra.
O som dos sinos, ouvido em uníssono oito décadas após a explosão, ecoou como lembrete da urgência de impedir que a história se repita.

Imagem: bbc.com