Maior fusão de buracos negros já observada inaugura nova etapa na astronomia de ondas gravitacionais

A colaboração internacional do Observatório de Ondas Gravitacionais por Interferômetro a Laser (LIGO) confirmou a detecção do evento GW231123, considerada a maior fusão de buracos negros já identificada. O sinal, captado em 2023 e analisado durante dois anos, foi anunciado em 14 de junho por meio de publicação da equipe responsável.
Os dados indicam que dois buracos negros de 100 e 140 massas solares, localizados a cerca de 10 bilhões de anos-luz, colidiram e originaram um objeto com 225 massas solares. A diferença de massa entre o sistema resultante e os corpos originais converteu-se em ondas gravitacionais, que viajaram pelo Universo até chegarem aos detectores terrestres.
A amplitude dessas ondulações era tão pequena ao atingir o planeta que representava variação de comprimento aproximadamente dez mil vezes inferior ao diâmetro de um próton. Ainda assim, o arranjo interferométrico do LIGO, com braços de quatro quilômetros em forma de “L”, foi capaz de registrar a passagem do fenômeno simultaneamente em suas instalações na Louisiana e em Washington.
Ao cruzar os feixes de laser dos dois laboratórios, os cientistas verificam se um braço do interferômetro sofreu dilatação diferente do outro. A concordância entre os sinais obtidos em locais separados por três mil quilômetros elimina ruídos provocados por vibrações locais e assegura que a interferência observada corresponde, de fato, a uma onda gravitacional.
O estudo revelou ainda que os buracos negros envolvidos giravam a cerca de 400 mil vezes a velocidade de rotação da Terra, próximo ao limite teórico previsto para esses objetos. Segundo os pesquisadores, ultrapassar esse ponto eliminaria o horizonte de eventos, expondo apenas a singularidade – possibilidade que a comunidade científica espera não ocorrer na natureza.
Antes da fusão, os astros formavam um sistema binário, orbitando em espiral até colidir. A dinâmica extrema gerou um padrão de ondas gravitacionais complexo que desafiou as simulações computacionais. Modelos empregados costumeiramente pelo consórcio, que costumam convergir na explicação da origem dos sinais, apresentaram resultados divergentes quando confrontados com a rotação acelerada observada.
Essa inconsistência ressaltou a necessidade de refinar os algoritmos utilizados para descrever sistemas de alta massa e elevada velocidade angular. A equipe pretende revisar as bibliotecas de templates numéricos com cenários mais abrangentes, reprocessar os dados e, assim, aprimorar a caracterização de fenômenos semelhantes que venham a ser captados futuramente.
Detectar ondas gravitacionais tornou-se viável em 2015, cem anos após a previsão teórica feita por Albert Einstein, quando o próprio LIGO registrou a primeira colisão de buracos negros. Desde então, dezenas de eventos foram identificados, mas nenhum havia envolvido objetos tão massivos quanto os observados em GW231123.
Para ampliar o alcance dessa linha de pesquisa, a comunidade científica prepara o lançamento da missão LISA (Laser Interferometer Space Antenna), parceria da Agência Espacial Europeia com a NASA. Previsto para 2035, o observatório espacial será composto por três naves dispostas em triângulo equilátero com 2,5 milhões de quilômetros de lado, orbitando atrás da Terra.
O arranjo orbital permitirá medir comprimentos de onda bem maiores que os disponíveis em instrumentos terrestres, possibilitando observar colisões de buracos negros supermassivos, fusões de galáxias e outras interações de escala cósmica. Além disso, o ambiente livre de perturbações sísmicas facilitará a obtenção de sinais mais limpos, complementando os dados coletados pelos detectores em solo.
Com a integração entre instalações baseadas na superfície e plataformas espaciais, astrônomos poderão combinar informações gravitacionais e eletromagnéticas de um mesmo evento, oferecendo um retrato mais completo das condições físicas envolvidas. Essa abordagem multimodal tende a esclarecer aspectos ainda desconhecidos sobre a formação, evolução e distribuição dos buracos negros pelo Universo.
A fusão identificada em GW231123, portanto, não apenas estabelece um novo recorde de massa para sistemas binários de buracos negros, mas também evidencia os limites dos atuais modelos teóricos. O aperfeiçoamento dessas ferramentas será essencial para interpretar de forma precisa os sinais que os futuros observatórios, como o LISA, deverão registrar.
Enquanto isso, o LIGO seguirá coletando dados em suas próximas campanhas de observação. Cada nova detecção alimenta catálogos que auxiliam na calibração de parâmetros, na validação de hipóteses e na construção de uma visão estatística sobre a população de buracos negros, ajudando a mapear sua importância na história cósmica.
O evento GW231123 reafirma o papel central da astronomia de ondas gravitacionais na exploração do espaço-tempo, demonstrando a capacidade humana de captar fenômenos distantes e extremos por meio de medições sensíveis e métodos colaborativos de análise.
Fonte: Olhar Digital

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