Governo prepara sistema brasileiro de navegação por satélite para reduzir dependência externa
O Gabinete de Segurança Institucional (GSI) instituiu, em 1º de julho, um grupo de trabalho encarregado de traçar um plano para criar um sistema nacional de posicionamento, navegação e tempo, alternativa ao GPS norte-americano. A medida tem como meta garantir autonomia tecnológica e minimizar riscos associados à utilização de constelações estrangeiras.
O comitê reúne representantes de quatro ministérios — Ciência e Tecnologia, Comunicações, Defesa e Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços — além da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). A coordenação caberá ao GSI, que conduzirá as reuniões no Palácio do Planalto, em Brasília.
Também participam o Comando da Aeronáutica, a Agência Espacial Brasileira (AEB), o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o Laboratório Nacional de Astrofísica (LNA) e a Telebras. Essas instituições deverão fornecer dados técnicos, infraestrutura laboratorial e estimativas de custo para viabilizar o projeto.
O decreto de criação do grupo estabelece prazo inicial de 180 dias, prorrogável por igual período, para apresentação de um relatório conclusivo. O documento deverá detalhar a arquitetura do sistema, etapas de desenvolvimento, cronograma, projeção orçamentária e modelos de governança.
Entre as tarefas previstas estão a identificação de desafios tecnológicos, como o desenho de satélites, protocolos de sinal e redes de estações de referência em solo. O levantamento de capacidades industriais instaladas no país e de eventuais lacunas em componentes críticos também faz parte do escopo.
O colegiado analisará, ainda, instrumentos de fomento necessários para sustentar a iniciativa. Fontes de financiamento público, parcerias com a iniciativa privada e incentivos a centros de pesquisa deverão constar das recomendações, juntamente com estratégias de transferência de tecnologia.
Outra atribuição é mapear vulnerabilidades decorrentes da dependência de sistemas estrangeiros. Questões de soberania, segurança de dados, continuidade de serviços civis, aplicações militares e impactos econômicos serão avaliados, segundo integrantes do grupo.
As discussões ocorrem em meio a especulações de que o ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump poderia restringir o funcionamento do GPS no Brasil. Nas redes sociais, aliados de Jair Bolsonaro citaram eventuais sanções que incluiram a suspensão do sinal, hipótese não confirmada por autoridades norte-americanas.
Um auxiliar do presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou à CNN que considera improvável o corte de fornecimento do GPS fora de um cenário de conflito armado. Na avaliação do assessor, tal medida afetaria empresas dos Estados Unidos que operam no mercado brasileiro e geraria prejuízos econômicos bilaterais.
Desenvolvido na década de 1970 para fins militares e liberado ao uso civil no fim do século passado, o GPS se tornou o padrão global de navegação. Nos últimos anos, entretanto, outros sistemas ganharam espaço, como o Beidou, da China, o Galileo, da União Europeia, e o GLONASS, da Rússia, todos com cobertura mundial.
A maioria dos smartphones vendidos no país já incorpora receptores compatíveis com essas constelações, o que reduziria eventuais impactos de uma interrupção do sinal norte-americano. Mesmo assim, o governo considera essencial dispor de uma solução doméstica para aplicações estratégicas.
Segundo técnicos envolvidos, o futuro serviço brasileiro poderá beneficiar agricultura de precisão, logística, defesa, aviação, pesquisas científicas e serviços de telecomunicações, setores que dependem de informações de localização em tempo real e de elevada confiabilidade.
Concluído o relatório, a Presidência deverá analisar a viabilidade financeira e o cronograma de implantação. Caso os estudos indiquem vantagens competitivas e sustentabilidade, o próximo passo será a contratação de fornecedores, o lançamento de satélites e a construção de estações terrestres, etapas que podem se estender por vários anos.
Fonte: Getty Images