Data centers superam explorações de petróleo em captação de recursos e impõem novo paradigma energético, aponta IEA

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Os centros de processamento de dados estão prestes a se tornar a maior frente de investimento em infraestrutura do planeta. Segundo projeção da Agência Internacional de Energia, os aportes globais direcionados aos data centers deverão totalizar US$ 580 bilhões em 2025, superando em cerca de US$ 40 bilhões o montante previsto para a exploração de novas reservas de petróleo. O volume reflete a aceleração da digitalização, o avanço da inteligência artificial e a consequente reorganização das prioridades econômicas e energéticas.
- Escala inédita de recursos mobilizados
- Demanda energética em forte ascensão
- Distribuição geográfica do consumo
- Perfil das novas instalações
- Gargalos na infraestrutura elétrica
- Escassez de materiais e componentes
- Rota para a matriz energética renovável
- Inovações para equilíbrio de rede
- Necessidade de planejamento coordenado
Escala inédita de recursos mobilizados
O valor de US$ 580 bilhões sinaliza uma inflexão histórica. Até poucos anos atrás, as companhias de petróleo figuravam no topo dos investimentos em infraestrutura, impulsionadas pela demanda por combustíveis fósseis. Agora, a construção, expansão e modernização de data centers assumem a liderança, indicando mudança estrutural na alocação de capital. O hiato de US$ 40 bilhões em favor da infraestrutura digital confirma que servidores, sistemas de armazenamento e instalações de alta capacidade tornaram-se ativos estratégicos para governos, empresas de tecnologia e para o setor financeiro.
Demanda energética em forte ascensão
A IEA estima que, até o final desta década, o consumo de eletricidade dos data centers voltados especificamente à inteligência artificial crescerá cinco vezes. Esse aumento representa o dobro do uso atual de energia em todas as instalações de processamento de dados combinadas, o que realça o peso dos algoritmos de aprendizado de máquina no gasto energético. Mesmo os complexos convencionais, que executam aplicações corporativas ou hospedagem de sites, devem aumentar a demanda, embora em ritmo mais lento.
Esse crescimento pressiona sistemas elétricos já sobrecarregados e impõe metas ambiciosas de eficiência para operadores. Até 2030, a somatória do consumo de data centers de IA e tradicionais tende a se aproximar dos níveis verificados hoje em nações industrializadas inteiras, ampliando a urgência por fontes de energia seguras e de baixo carbono.
Distribuição geográfica do consumo
Cerca de 50 % do salto projetado no uso de eletricidade ocorrerá nos Estados Unidos, onde os grandes provedores de nuvem abriram caminhos para megacomplexos de servidores. A parcela remanescente dividir-se-á principalmente entre Europa e China, regiões que apostam em inteligência artificial para fomentar competitividade industrial e modernizar serviços públicos.
Dentro desses territórios, os projetos concentram-se em polos urbanos com população acima de 1 milhão de habitantes. A proximidade de mão de obra qualificada, redes de fibra ótica e demanda de clientes favorece essa localização. Entretanto, a densidade demográfica eleva a complexidade de obtenção de licenças, acarretando disputas por terrenos, limites de ruído, emissões e uso de água para resfriamento.
Perfil das novas instalações
Metade dos empreendimentos anunciados possui capacidade superior a 200 megawatts, sinalizando tendência a complexos de escala industrial. Muitos estão sendo erguidos em clusters, onde diversos operadores compartilham subestações, linhas de transmissão e até sistemas de resfriamento. Essa configuração cria sinergias logísticas, mas também concentra riscos: qualquer indisponibilidade de rede pode afetar simultaneamente múltiplos provedores.
Além do porte, a arquitetura dos edifícios evolui para suportar chips especializados em IA, que geram calor significativamente maior que processadores convencionais. Como consequência, avançam soluções de resfriamento líquido direto aos racks e de reaproveitamento de calor para aquecimento distrital em regiões frias.
Gargalos na infraestrutura elétrica
O ritmo de construção desafia a agilidade das concessionárias. A IEA identifica filas de conexão prolongadas e sobrecarga nas linhas de transmissão. No norte da Virgínia, principal polo global de data centers, o prazo para que um projeto seja efetivamente conectado à rede pode chegar a dez anos. Em Dublin, capital irlandesa, novos pedidos de interconexão permanecem suspensos até 2028, refletindo preocupação com a estabilidade do sistema elétrico local.
Esses entraves atrasam o início de operações, elevam custos e podem deslocar investimentos para regiões com energia disponível. A demora também evidencia a necessidade de modernizar subestações, automatizar redes e ampliar a coordenação entre planejadores de infraestrutura e desenvolvedores de data centers.
Escassez de materiais e componentes
Além da falta de capacidade de rede, o setor enfrenta escassez de cabos de alta tensão, transformadores e minerais críticos. O avanço simultâneo de energia renovável, eletrificação veicular e data centers disputa os mesmos insumos, pressionando cadeias de suprimentos. A reposição de transformadores, por exemplo, demanda meses ou até anos, o que retarda expansões e revisões de carga.
Minerais como cobre, níquel e elementos de terras raras são imprescindíveis tanto para servidores quanto para sistemas de geração limpa. A tensão sobre esses recursos pode influenciar preços e provocar oscilações na viabilidade econômica de projetos, caso não haja diversificação de fornecedores e melhoria na reciclagem de materiais.
Rota para a matriz energética renovável
A IEA projeta que, até 2035, a maior parte da eletricidade consumida pelos data centers venha de fontes renováveis. O cálculo atribui aproximadamente 400 terawatts-hora de geração a solares, eólicas e outras tecnologias limpas na próxima década. A queda de custo dos painéis fotovoltaicos, combinada com contratos de compra de energia de longo prazo, torna a solar a principal aposta do segmento.
O gás natural continuará relevante, somando estimados 220 terawatts-hora, principalmente onde a flexibilidade da geração térmica é necessária para complementar fontes intermitentes. Pequenas usinas nucleares modulares podem adicionar até 190 terawatts-hora, oferecendo produção constante sem emissões diretas de carbono. Esta diversificação busca mitigar riscos de volatilidade de preços e garantir estabilidade ao sistema.
Inovações para equilíbrio de rede
Empresas de tecnologia elétrica desenvolvem equipamentos capazes de integrar de forma mais eficiente grandes cargas digitais a fontes limpas. Amperesand e Heron Power trabalham em transformadores de estado sólido, dispositivos que prometem reduzir perdas, aumentar a velocidade de resposta da rede e facilitar o controle bidirecional de fluxo de energia. As primeiras aplicações comerciais são esperadas para os próximos anos e podem se tornar fundamentais para viabilizar a eletrificação acelerada dos parques de servidores.
Necessidade de planejamento coordenado
O cenário delineado pela IEA evidencia que data centers já são pilares indispensáveis da economia digital. Contudo, seu avanço depende de alinhamento entre investidores, operadores de rede, reguladores e fornecedores de equipamentos. Sem soluções para os gargalos identificados – sobrecarga de linhas, falta de componentes e integração de renováveis – o crescimento previsto pode enfrentar limitações físicas que retardariam a expansão da infraestrutura digital em escala global.

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