Pesquisadores brasileiros criam composto quelante de cobre que reduz sintomas de Alzheimer em testes pré-clínicos

Um grupo de pesquisadores da Universidade Federal do ABC (UFABC) apresentou um composto químico capaz de degradar placas beta-amiloides, estruturas associadas ao desenvolvimento do Alzheimer. Em experimentos com ratos, a molécula reduziu sintomas cognitivos típicos da doença sem demonstrar toxicidade, abrindo caminho para futuros ensaios clínicos.
A dimensão global do Alzheimer
Estima-se que cerca de 50 milhões de pessoas convivam atualmente com o Alzheimer em todo o planeta. Projeções para 2050 indicam que esse total pode ultrapassar 130 milhões, reforçando o caráter epidêmico da enfermidade. A expansão da expectativa de vida e o envelhecimento populacional elevam a prevalência e pressionam sistemas de saúde a buscarem terapias mais eficazes e economicamente viáveis.
Como a doença se manifesta
O Alzheimer é um transtorno neurodegenerativo progressivo. Entre os sinais clínicos mais frequentes estão a perda de memória recente, dificuldades de linguagem, alterações de raciocínio e desorientação espacial. Conforme os neurônios se deterioram, essas funções declinam gradualmente, comprometendo a autonomia do indivíduo. Mesmo com avanços na pesquisa, identificar o estágio exato da doença e interferir de forma decisiva em sua progressão permanece um desafio.
O papel do cobre nas placas beta-amiloides
Há aproximadamente uma década, trabalhos internacionais chamaram atenção para a influência dos íons de cobre na agregação das placas beta-amiloides. Essas placas se formam a partir de fragmentos do peptídeo amiloide-β, que se depositam entre os neurônios, provocam inflamação e interrompem a comunicação sináptica. Mutações genéticas e alterações em enzimas de transporte de cobre podem levar ao acúmulo do metal no cérebro, favorecendo a união desses fragmentos em estruturas insolúveis. A partir desse conhecimento, regular a homeostase de cobre tornou-se uma linha promissora no combate ao Alzheimer.
Desenvolvimento do novo composto
Com base na hipótese da desregulação do cobre, a equipe da UFABC sintetizou dez moléculas capazes de atravessar a barreira hematoencefálica, estrutura que protege o sistema nervoso central contra agentes externos. As moléculas foram projetadas para atuar como quelantes, isto é, para se ligar ao cobre excedente presente nas placas beta-amiloides. A fase inicial envolveu simulações computacionais (in silico) que avaliaram estabilidade estrutural, afinidade pelo metal e capacidade de penetração no cérebro.
Na etapa seguinte, culturas celulares (in vitro) permitiram identificar três candidatos com desempenho superior na remoção de cobre. Esses três compostos prosseguiram para experimentos em animais (in vivo). Um deles destacou-se tanto pela eficácia quanto pela ausência de sinais de toxicidade, tornando-se o principal foco do estudo divulgado pela revista ACS Chemical Neuroscience.
Mecanismo de ação do quelante
O composto selecionado apresenta síntese considerada simples pelos autores. Depois de administrado, ele alcança o tecido neural, reconhece íons de cobre e forma um complexo estável. A captura do metal fraquece as interações que mantêm unidas as cadeias do peptídeo amiloide-β, induzindo sua fragmentação. A degradação subsequente reduz o número e o tamanho das placas, fator que, de acordo com o trabalho, contribui para a diminuição de processos inflamatórios e melhora da transmissão sináptica.
Evidências obtidas em testes pré-clínicos
Ratos com Alzheimer induzido receberam doses previamente calculadas do quelante. Avaliações comportamentais mostraram que, em comparação ao grupo controle, os animais tratados apresentaram menor perda de memória, melhor orientação espacial e desempenho superior em tarefas de aprendizado. Exames histológicos revelaram ainda uma reversão no padrão das placas beta-amiloides, indicando não apenas contenção, mas também regressão das estruturas patológicas.
Segurança e potencial de acesso
A segurança do candidato terapêutico foi verificada por meio de análises hematológicas, bioquímicas e anatomopatológicas. Os pesquisadores não observaram alterações significativas em órgãos vitais nem indicadores de toxicidade sistêmica. Outro ponto ressaltado é o baixo custo de produção. A simplicidade da rota sintética sugere que, caso a eficácia seja confirmada em humanos, o medicamento poderá ser disponibilizado a preços mais acessíveis que os atuais fármacos voltados ao Alzheimer.
Caminho até a aplicação clínica
Com os resultados pré-clínicos em mãos, a equipe busca parcerias com empresas farmacêuticas para iniciar ensaios clínicos em voluntários. Essa fase, que ocorre em múltiplas etapas, avalia dose, segurança e eficácia em diferentes perfis de pacientes. Embora o Alzheimer tenha origem multifatorial, os autores consideram que mesmo benefícios parciais representariam avanço relevante diante do cenário limitado de opções terapêuticas.
A pesquisa demonstra que a estratégia de remover cobre das placas beta-amiloides pode traduzir evidências laboratoriais em efeitos funcionais. Se confirmada em humanos, a abordagem poderá integrar um portfólio de terapias combinadas, contribuindo para retardar a progressão da doença e melhorar a qualidade de vida de milhões de pessoas.
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