China acelera uso de IA e mira independência tecnológica até 2028

A China intensificou a implantação de ferramentas de inteligência artificial (IA) em múltiplos sectores da economia para contornar as restrições impostas pelos Estados Unidos ao acesso a chips avançados. Pequim tem colocado a ênfase na aplicação prática da tecnologia em saúde, educação, segurança pública e administração governamental, numa estratégia que procura diminuir a dependência de fornecedores ocidentais e reforçar a autossuficiência do ecossistema nacional de IA.

IA expande-se em serviços públicos e empresariais

Hospitais militares, autoridades locais e empresas estatais adoptaram sistemas de IA para consultas médicas em linha, gestão de registos clínicos, triagem de chamadas e investigações anticorrupção. Documentos de contratação pública mostram que a plataforma DeepSeek foi escolhida para apoiar operações policiais e prever tendências criminais, ajudando a acelerar a recolha de pistas e a optimizar recursos. Segundo uma prefeitura na Mongólia Interior, a ferramenta “melhora a precisão e a pontualidade no combate ao crime”.

Num evento dedicado à inteligência artificial realizado em Xangai, a World Artificial Intelligence Conference, o primeiro-ministro Li Qiang declarou que o país assume “grande importância” na governação global da IA e está disposto a partilhar experiências com nações em desenvolvimento. Representantes de empresas chinesas sublinharam que o foco no uso concreto da tecnologia, em vez da mera criação de modelos de última geração, tem permitido ganhos rápidos de produtividade.

Especialistas reconhecem, contudo, limitações técnicas. Shen Yang, professor da Universidade Tsinghua, alerta para a persistência de “alucinações” nos sistemas de linguagem e para obstáculos burocráticos que restringem o emprego da IA em investigações sensíveis. “Se o modelo errar, quem assume a responsabilidade?”, questionou o académico.

Plano nacional para chips e mão-de-obra qualificada

Pequim complementa a expansão de aplicações com um programa de independência tecnológica. A iniciativa Projecto Pneu Sobressalente, liderada pela Huawei, tem como meta alcançar 70 % de autossuficiência em semicondutores até 2028, com o envolvimento de mais de duas mil empresas. A consultora Morgan Stanley prevê que, em 2027, 82 % dos chips de IA utilizados por entidades chinesas sejam de produção interna, acima dos 34 % estimados para 2024.

Mesmo com componentes menos avançados, fabricantes nacionais recorrem a clusters de chips para elevar o desempenho. Em alguns cenários, sistemas baseados nos processadores Ascend, da Huawei, superaram soluções comerciais da Nvidia. Para reforçar a cadeia de abastecimento, a cidade de Shenzhen mobilizou 700 milhões de dólares para projectos de semicondutores.

O esforço inclui a formação de profissionais. Desde 2019, o número de universidades com cursos de IA passou de 35 para mais de 600. A partir de Setembro, escolas primárias e secundárias de Pequim vão introduzir aulas obrigatórias sobre inteligência artificial, procurando criar uma base de competências que sustente o crescimento da indústria.

Resposta norte-americana enfrenta entraves logísticos

Nos Estados Unidos, debates regulatórios e limitações de infra-estrutura atrasam iniciativas em larga escala. Um plano de 500 mil milhões de dólares anunciado por OpenAI e SoftBank sofreu reprogramações, e a construção de novos centros de dados exige alterações legislativas para acelerar licenças. Para colmatar lacunas de competências, a Casa Branca assinou uma ordem executiva que torna obrigatória a oferta de formação em IA nas escolas do país.

Washington também usa controlos de exportação para travar o avanço chinês, restringindo o envio de determinados chips. Ainda assim, acabou por autorizar a venda do modelo H20 da Nvidia, numa medida interpretada como tentativa de equilibrar pressões comerciais. Analistas observam que, apesar destas restrições, a China tem ganho terreno com modelos de código aberto: relatórios independentes indicam que a melhor solução open-source disponível no mercado é actualmente chinesa.

Enquanto os EUA concentram recursos na investigação de vanguarda, a China aposta na disseminação rápida da IA por toda a sociedade. Essa diferença de abordagem, respaldada por financiamento governamental, políticas de educação tecnológica e metas de produção de semicondutores, coloca o país asiático num caminho que combina adopção interna massiva e progressiva independência face a fornecedores estrangeiros.

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Imagem: Pixels Hunter via olhardigital.com.br

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