Ar dos dinossauros recriado em laboratório revela níveis de CO₂ muito superiores aos atuais

Uma equipa internacional conseguiu estimar a composição do ar respirado pelos dinossauros ao analisar isótopos de oxigénio preservados em dentes fossilizados. O estudo, publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), indica que a atmosfera da Era Mesozoica apresentava concentrações de dióxido de carbono muito mais elevadas do que as registadas atualmente.

Método baseia-se no isótopo oxigénio-17

O trabalho partiu do princípio de que os tecidos biológicos incorporam vestígios do ambiente em que os organismos viveram. Entre esses marcadores químicos encontra-se o isótopo oxigénio-17, presente numa fração mínima das moléculas de dióxido de oxigénio. Vertebrados modernos incorporam parte desse isótopo na água corporal e, posteriormente, no esmalte dos dentes.

Como o esmalte é altamente resistente à erosão, pequenas quantidades de oxigénio-17 podem permanecer estáveis durante milhões de anos, funcionando como um registo do clima passado. Para confirmar esta premissa, os investigadores testaram o método em 2024 em dentes de animais vivos e demonstraram que a proporção de isótopos reflete fielmente a quantidade de CO₂ na atmosfera em que cada espécime se desenvolveu.

Com o procedimento validado, foi recolhido pó de esmalte de fósseis conservados em oito museus da Europa e da América do Norte, incluindo o Museu de História Natural de Berlim (Alemanha) e o Royal Tyrrell Museum (Canadá). Amostras de saurópodes, terópodes e outros grupos forneceram uma visão panorâmica dos diferentes períodos do Mesozoico.

Níveis de CO₂ ultrapassavam 1000 ppm no Jurássico

As medições indicam que, no final do Jurássico (entre 201 e 145 milhões de anos), a atmosfera continha cerca de 1200 partes por milhão (ppm) de dióxido de carbono. Já no fim do Cretácico (145 a 66 milhões de anos), a concentração situava-se em torno de 750 ppm. Para comparação, os valores atuais rondam 430 ppm, segundo a Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA).

Os autores associam estas concentrações elevadas a intensa atividade vulcânica, fenómeno que liberta grandes quantidades de CO₂ e outros gases de efeito de estufa. Dois fósseis — um dente de saurópode e outro de tiranossauro — exibiram assinaturas isotópicas especialmente ricas em oxigénio-17, sugerindo picos de vulcanismo nas regiões onde esses animais viveram.

Contribuições para o conhecimento climático

Os resultados coincidem com investigações anteriores que já apontavam para uma atmosfera quente e rica em dióxido de carbono durante a Era Mesozoica. Ao quantificar diretamente a composição do ar a partir de material biológico, o método fornece uma ferramenta independente de modelos geológicos ou reconstruções indiretas.

Além de esclarecer as condições ambientais que influenciaram a evolução dos dinossauros, a pesquisa ajuda a compreender a paleoclimatologia global. A identificação de correlações entre níveis de CO₂, atividade vulcânica e biodiversidade pode apoiar projeções sobre o impacto das emissões atuais de gases de efeito de estufa.

Próximo passo: investigar a “Grande Morte”

A equipa pretende aplicar a mesma abordagem a fósseis de cerca de 250 milhões de anos, período associado à maior extinção em massa da história, conhecida como Grande Morte. Naquela altura, erupções vulcânicas prolongadas terão coberto vastas áreas do planeta com lava e libertado quantidades colossais de gases na atmosfera.

Ao estimar as concentrações de dióxido de carbono antes, durante e depois desse evento, os investigadores esperam clarificar como a química atmosférica evoluiu e de que forma influenciou oceanos, clima e ecossistemas. Os dados poderão ainda revelar a velocidade com que o planeta recuperou da perda massiva de espécies.

Embora dependente da disponibilidade de fósseis bem preservados, a técnica baseada em oxigénio-17 abre novas possibilidades para reconstruir alterações climáticas antigas com precisão sem precedentes. Segundo os autores, cada dente fossilizado funciona como uma cápsula do tempo microscópica, capaz de transportar informação sobre temperaturas, concentrações de gases e processos geológicos ocorridos há centenas de milhões de anos.

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Imagem: Thomas Tütken via olhardigital.com.br

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