Por que os criminosos retratados em Tremembé não recebem pagamento pela série do Prime Video

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A série Tremembé, um dos maiores destaques recentes do catálogo da Amazon Prime Video, dramatiza episódios envolvendo detentos famosos do presídio de mesmo nome e apresenta vários deles pelo nome real. O êxito da produção levantou uma dúvida recorrente entre o público: os criminosos retratados recebem alguma compensação financeira ou ao menos precisam autorizar que suas histórias sejam contadas? Especialistas ouvidos pela imprensa afirmam que, à luz da legislação brasileira, não existe obrigação de pagamento ou de consentimento prévio pelos fatos narrados.
- Quem são os retratados e quem produz a obra
- O que diz a lei brasileira sobre obras inspiradas em processos penais públicos
- Como a produção validou a segurança jurídica
- Por que alguns personagens utilizam pseudônimos
- O papel do livro original na construção da série
- Declarações dos atores sobre o não pagamento aos detentos
- Abordagem da direção e fontes de pesquisa
- Consequências práticas para futuras produções semelhantes
- Impacto nos retratados e no debate público
Quem são os retratados e quem produz a obra
Tremembé reúne personagens que ocuparam durante anos as manchetes policiais e cujos processos penais são de domínio público. Interpretados por atores como Kelner Macêdo e Letícia Rodrigues, esses indivíduos continuam vivos e, em muitos casos, permanecem cumprindo pena. A série é uma produção original da Amazon Prime Video e tem como base o livro de reportagem escrito por Ulisses Campbell. O escritor participa do projeto como consultor e, segundo informações divulgadas, é o único a receber royalties decorrentes da adaptação.
O que diz a lei brasileira sobre obras inspiradas em processos penais públicos
De acordo com o advogado e professor Rodrigo Moraes, da Universidade Federal da Bahia, a legislação nacional não estabelece a necessidade de obter autorização ou pagar remuneração a pessoas condenadas quando a narrativa se limita a fatos extraídos de processos penais públicos. A Constituição garante a livre manifestação artística e o direito à informação. Como os crimes julgados envolvem documentos acessíveis ao público, qualquer autor pode transformá-los em livros, filmes ou séries, desde que não inclua conteúdos que extrapolem as peças processuais ou violem direitos de personalidade, como honra e imagem, de forma ilícita.
Como a produção validou a segurança jurídica
Antes de chegar à plataforma de streaming, Tremembé passou por uma revisão minuciosa conduzida pelo departamento jurídico do Prime Video. O procedimento acontece para assegurar que não haja risco de litígios posteriores por parte dos retratados. Nessa etapa, advogados analisam roteiros, checam a aderência dos fatos aos autos judiciais e verificam se algum trecho poderia ser interpretado como acusação nova ou difamação. Concluído o parecer, a empresa confirma que não existe obrigação de remuneração nem de consulta aos presos, respaldando a decisão de lançar a obra sem acordos financeiros com eles.
Por que alguns personagens utilizam pseudônimos
Ainda que os protagonistas apareçam com nomes verdadeiros, parte do elenco secundário surge com identidades ficcionais. Segundo a advogada Nathalia Rocha, essa escolha atende a duas finalidades. A primeira é simplificar a narrativa, já que muitos casos envolvem múltiplos réus com participação limitada no enredo. A segunda é minimizar o risco de conflito sobre pontos que não constam nos autos, pois, ao atribuir um pseudônimo, o roteirista pode resumir características de diferentes pessoas sem ligar uma conduta específica a um indivíduo identificável. Trata-se, portanto, de um recurso que reduz a chance de demandas judiciais sem comprometer o realismo geral.
O papel do livro original na construção da série
A obra de Ulisses Campbell, fruto de extensa pesquisa em arquivos públicos, depoimentos e sentenças, serviu de base documental para o roteiro televisivo. Por ter produzido material original e organizado informações disponíveis em processos, o autor detém direitos autorais sobre a forma como apresentou os fatos, mas não sobre os fatos em si. É essa distinção que lhe garante o recebimento de royalties pela adaptação, enquanto os criminosos, protagonistas da história real, não têm direito a participação financeira, uma vez que não existe propriedade intelectual sobre acontecimentos verídicos.
Declarações dos atores sobre o não pagamento aos detentos
Em participação no podcast Odeio Cinema, Kelner Macêdo e Letícia Rodrigues confirmaram que nenhum detento recebeu qualquer quantia pela série. Eles também revelaram não ter mantido contato com os criminosos durante a preparação dos papéis. As observações dos intérpretes reiteram a postura adotada pela produção, que buscou referências em material jornalístico, laudos periciais e entrevistas de arquivo, mas não considerou indispensável a interação direta com os condenados.
Abordagem da direção e fontes de pesquisa
A diretora Vera Egito, em conversa com a imprensa, relatou que a equipe realizou ampla investigação baseada em processos, reportagens e registros audiovisuais disponíveis. Ela classificou Tremembé como uma ficção inspirada em acontecimentos concretos, montada a partir de múltiplas fontes para reconstituir ambiente, cronologia e perfil psicológico dos envolvidos. O método empregado reforça o entendimento de que a produção se apoia em material público, condição que afasta exigências de licenciamento individual.
Consequências práticas para futuras produções semelhantes
O caso Tremembé ilustra um padrão aplicável a outras adaptações de crimes reais no Brasil. Enquanto o conteúdo for extraído de processos públicos, escritores, roteiristas e plataformas de streaming permanecem amparados pelo direito à livre expressão e pelo interesse jornalístico. Royalties se vinculam à autoria da obra derivada ─ livro ou roteiro ─ e não às pessoas retratadas. Por outro lado, permanece o cuidado de não adicionar situações inventadas que maculem a honra dos envolvidos, pois, nesse cenário, poderia haver pedido de reparação por danos morais.
Impacto nos retratados e no debate público
Embora não recebam valores pela exibição, os criminosos acabam reingressando na pauta popular toda vez que séries como Tremembé ganham repercussão. A exposição retoma discussões sobre sistema carcerário, segurança pública e direitos de personalidade. Para os produtores, o limite entre informar e explorar é regulado tanto pela lei quanto pela recepção da audiência. No caso específico, o Prime Video entende que a narrativa cumpre função cultural e jornalística, pois evidencia fatos já conhecidos que permanecem de interesse coletivo.
Com a confirmação de que não há repasse financeiro aos detentos e de que a obra se apoia em documentos acessíveis, Tremembé exemplifica como a combinação de pesquisa, revisão jurídica e cuidado narrativo permite adaptar crimes reais sem violar normas nem necessitar de autorização dos envolvidos.
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