Marco regulatório dos streamings avança na Câmara com contribuição à Condecine e cota de conteúdo brasileiro

Marco regulatório dos streamings avança na Câmara com contribuição à Condecine e cota de conteúdo brasileiro

Regulamentar um setor em rápida expansão, estabelecer novas fontes de financiamento para o audiovisual nacional e equilibrar a competição entre empresas estrangeiras e produtoras locais. Esses são os eixos do Projeto de Lei 8.889/17, cujo texto-base foi aprovado pela Câmara dos Deputados na noite de 4 de junho. Por 308 votos favoráveis e 103 contrários, os parlamentares autorizaram a criação de um marco regulatório para os serviços de streaming que operam no Brasil, inaugurando obrigações de contribuição financeira e de reserva de espaço para obras nacionais nos catálogos.

Índice

Detalhes da votação e próximos passos legislativos

A apreciação do texto ocorreu no plenário da Câmara dos Deputados, em Brasília. O projeto é de autoria do deputado Paulo Teixeira (PT-SP) e recebeu parecer favorável do relator Doutor Luizinho (PP-RJ). Após a aprovação do texto-base, estão programadas votações de destaques que podem suprimir ou alterar trechos específicos. Concluída essa etapa, o projeto seguirá para o Senado, onde passará por nova análise antes de eventual sanção presidencial.

Estrutura da contribuição anual que incidirá sobre as plataformas

O ponto central da proposta é a criação de uma cobrança anual vinculada à Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine). O tributo será calculado sobre o faturamento bruto das plataformas de streaming, incluídas as receitas obtidas com publicidade. A alíquota varia de acordo com a categoria de serviço e com a faixa de receita declarada.

Para plataformas de vídeo sob demanda — caso de Netflix, Prime Video e serviços semelhantes —, a taxa oscila entre 0,5% e 4%. Já para plataformas de compartilhamento de vídeos, como o YouTube, o percentual aplicável fica entre 0,1% e 0,8%. Empreendimentos com faturamento anual de até R$ 4,8 milhões ficam dispensados do recolhimento, criando um piso de isenção destinado a empresas de menor porte.

O valor arrecadado será encaminhado ao Fundo Setorial do Audiovisual (FSA), principal fonte pública de financiamento para produções de cinema e televisão no país. Dessa forma, a proposta liga diretamente a rentabilidade das plataformas à sustentação econômica do próprio mercado audiovisual brasileiro.

Mecanismo de abatimento por investimento direto

Além da cobrança escalonada, o texto permite que as plataformas reduzam a quantia a pagar caso optem por investir em produções brasileiras. O abatimento pode chegar a 60% da contribuição devida, instituindo um estímulo financeiro para que as empresas direcionem recursos às produtoras locais. Esse modelo replica, em parte, lógicas já utilizadas em políticas públicas de incentivo, nas quais o contribuinte reverte parte do tributo em investimento cultural.

Cotas de conteúdo nacional nos catálogos

O projeto também introduz uma exigência inédita de presença mínima de obras brasileiras nos serviços de streaming. Pelo menos 10% do catálogo de cada plataforma deverá ser composto por produções nacionais, sendo que metade desse percentual terá de ser originada de produtoras independentes. A regra vale independentemente do local de sede da empresa, alcançando tanto companhias brasileiras quanto estrangeiras que ofertam conteúdo no território nacional.

A fiscalização da cota será responsabilidade da Agência Nacional do Cinema (Ancine). Caberá ao órgão credenciar as plataformas, definir critérios técnicos para aferição do catálogo e aplicar eventuais sanções em caso de descumprimento.

Objetivos declarados pelos defensores da proposta

Durante a discussão em plenário, o relator Doutor Luizinho justificou o projeto como instrumento para estabelecer concorrência equilibrada entre plataformas globais e produtoras brasileiras. Parlamentares favoráveis alegaram que a medida gera novos empregos no setor cultural, fortalece a cadeia produtiva audiovisual e preserva a soberania cultural, ao garantir espaço permanente para obras locais.

Deputadas alinhadas ao governo, como Jandira Feghali (PCdoB-RJ) e Ana Pimentel (PT-MG), compararam a iniciativa às regras já vigentes para a televisão por assinatura, defendendo a equiparação de obrigações como forma de isonomia regulatória.

Pontos críticos levantados pela oposição

Parlamentares contrários, entre eles Marcel van Hattem (Novo-RS) e Nikolas Ferreira (PL-MG), argumentaram que a nova taxa tende a ser repassada aos consumidores, provocando aumento no preço das assinaturas. Segundo esse grupo, a exigência pode reduzir a concorrência ao favorecer grandes produtoras estabelecidas, além de criar barreiras para serviços menores.

Críticos também compararam a contribuição proposta à chamada “taxa das blusinhas”, expressão utilizada para se referir à tributação de compras internacionais de pequeno valor. Para a oposição, ambos os casos representariam expansão da carga tributária com potencial impacto direto sobre o consumidor final.

Reações do setor audiovisual

As discussões extrapolaram o Congresso e mobilizaram profissionais do audiovisual. O movimento “Pega a Visão: Ato pelo VoD” organizou manifestações em capitais como Rio de Janeiro, São Paulo e Salvador, com atos em frente a instituições ligadas ao cinema e à cultura. Participantes alegaram que o texto aprovado favorece grandes plataformas estrangeiras, reduz a arrecadação pública destinada ao FSA e diminui o papel do Estado no fomento cultural.

Nesse grupo, a cineasta Lúcia Murat classificou o projeto como uma espécie de “Lei Rouanet para os streamings”, sustentando que as empresas poderiam usar recursos públicos em produções próprias. Um manifesto assinado por roteiristas, diretores e atores — entre eles Laís Bodanzky, Anna Muylaert, Jorge Furtado, Gabriel Mascaro e Marieta Severo — apontou risco de enfraquecimento do FSA e de redução da autonomia de produtoras independentes.

Em nota técnica conjunta, a Ancine e o Ministério da Cultura também alertaram para possíveis perdas de recursos e para brechas que dificultariam a fiscalização da contribuição.

Apoio de parte das produtoras independentes

Embora haja críticas, 96 produtoras brasileiras divulgaram documento de apoio ao texto. Entre os signatários aparecem O2, Paranoid e Paris Produções. Elas classificaram a proposta como avanço pragmático e robusto, avaliando que a contribuição escalonada e a possibilidade de abatimento por investimento direto representam caminho viável para fortalecer o setor sem comprometer a sustentabilidade das plataformas.

Como o tributo se relaciona com o Fundo Setorial do Audiovisual

O FSA é financiado principalmente por receitas da Condecine, já aplicada sobre salas de cinema, emissoras de televisão e distribuidores de conteúdo audiovisual. Ao incluir os serviços de streaming nesse universo, o projeto busca ampliar a base arrecadatória e compensar a migração de público para o ambiente digital. A expectativa dos autores é que a nova fonte de recursos possibilite apoio contínuo a longas-metragens, séries, documentários e animações, dinamizando a produção em todas as regiões do país.

Fiscalização, credenciamento e possíveis sanções

A atribuição de monitorar o cumprimento das regras ficará com a Ancine. O órgão deverá estabelecer parâmetros para mensurar a composição do catálogo, verificar os percentuais de conteúdo nacional e validar informações de faturamento apresentadas pelas plataformas. Caso haja descumprimento, a agência poderá aplicar multas ou, em última instância, suspender a oferta do serviço no território nacional, conforme procedimentos já previstos na legislação setorial.

Calendário previsto para implementação

O texto aprovado estipula que as novas regras entrem em vigor após regulamentação detalhada, a ser elaborada pela Ancine. O cronograma definitivo dependerá da tramitação no Senado e da eventual sanção. Somente depois da publicação da norma regulamentadora é que as plataformas começarão a recolher a contribuição e a ajustar seus catálogos para cumprir a cota de obras brasileiras.

Perspectivas para o debate no Senado

No Senado, o projeto deve passar pelas comissões temáticas de Cultura e de Assuntos Econômicos antes de seguir ao plenário. Senadores poderão propor alterações que, se aprovadas, farão o texto retornar à Câmara. Entre os pontos que tendem a gerar discussão estão o teto da alíquota, o percentual de abatimento por investimento e os critérios de medição do catálogo.

Enquanto o debate prossegue, o setor audiovisual acompanha atentamente os desdobramentos. O resultado final terá impacto direto sobre a estrutura de financiamento, o acesso do público a obras brasileiras e as estratégias comerciais das plataformas que atuam no país.

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