AVC no Brasil: uma morte a cada seis minutos e 80% dos casos poderiam ser evitados, mostram dados oficiais

O acidente vascular cerebral (AVC) permanece entre as principais causas de morte no país, gerando um óbito a cada seis minutos e lançando luz sobre a urgência de estratégias preventivas que, segundo autoridades de saúde, poderiam evitar oito em cada dez episódios. O impacto, entretanto, não se limita à perda de vidas: o sistema hospitalar acumula gastos expressivos enquanto a doença se dissemina por faixas etárias cada vez mais jovens.
Dimensão do problema: mortalidade e custos
As doenças cardiovasculares concentram cerca de 30% das mortes registradas anualmente no território nacional, e o AVC representa parcela significativa desse total. De janeiro a outubro deste ano, 64.471 brasileiros perderam a vida em decorrência do evento cerebrovascular, um volume que sustenta a estatística de um falecimento a cada seis minutos. No ano completo anterior, foram mais de 85 mil óbitos, posicionando o Brasil entre os países com maior carga da doença.
A pressão sobre o sistema de saúde reflete-se nos gastos hospitalares. Entre 2019 e setembro de 2024, o tratamento de pacientes acometidos por AVC consumiu R$ 910 milhões, com mais de 85 mil internações registradas. Um em cada quatro pacientes precisou de leito em unidade de terapia intensiva (UTI), o que amplia o custo per capita e evidencia a gravidade das complicações neurológicas associadas.
O fardo econômico soma-se ao impacto social das sequelas duradouras, que limitam a autonomia de sobreviventes e elevam a demanda por reabilitação prolongada. A combinação de mortalidade elevada, internações frequentes e despesas robustas consolida o AVC como questão prioritária de saúde pública.
Principais fatores de risco
Autoridades sanitárias e a Sociedade Brasileira de AVC (SBAVC) estimam que 80% dos episódios poderiam ser evitados com intervenções simples sobre fatores de risco. A hipertensão arterial lidera a lista, por ser silenciosa e amplamente controlável por meio de acompanhamento médico e adesão a tratamento medicamentoso. O controle rigoroso da pressão arterial é classificado como a medida isolada de maior impacto.
Outras condições que aumentam substancialmente a probabilidade de um evento cerebrovascular incluem diabetes, obesidade, colesterol elevado, tabagismo e sedentarismo. A interação desses elementos forma um perfil de risco combinado que, muitas vezes, se agrava em razão de hábitos alimentares inadequados e baixa prática de atividade física.
A recomendação de especialistas concentra-se em três frentes interligadas: alimentação equilibrada, abandono do cigarro e exercícios regulares. Tais medidas, além de reduzirem a probabilidade de AVC, contribuem para a prevenção de infarto, hipertensão e outras doenças crônicas.
Diferentes formas de AVC
Dois tipos principais de acidente vascular cerebral são reconhecidos: o isquêmico e o hemorrágico. O primeiro, responsável por 85% dos casos, ocorre quando um vaso sanguíneo que irriga o cérebro é obstruído, interrompendo o fluxo de oxigênio para a área afetada. O segundo, que corresponde a 15% dos episódios, resulta do rompimento de uma artéria cerebral, provocando sangramento intracraniano.
Embora menos frequente, o AVC hemorrágico é considerado mais grave, com maior risco de sequelas permanentes e letalidade superior. A distinção entre os dois subtipos é fundamental para a escolha do tratamento, pois estratégias de intervenção divergem de acordo com a causa subjacente.
Avanço da doença entre jovens adultos
Tradicionalmente associado a pessoas idosas, o AVC demonstra tendência de crescimento em faixas etárias mais baixas. Dados da SBAVC apontam aumento de 66% na ocorrência do tipo isquêmico entre brasileiros com menos de 45 anos na última década. Há fatores específicos que contribuem para esse deslocamento epidemiológico.
A persistência do forame oval, condição cardíaca que facilita a passagem de coágulos para o cérebro, está entre os motivos apontados. Também ganham relevância a combinação de tabagismo com anticoncepcionais hormonais, que multiplica o risco de trombose, e o uso de anabolizantes ou testosterona em academias, associado ao aumento de eventos trombóticos graves.
Além dos fatores orgânicos, componentes comportamentais exercem influência crescente. Estresse crônico, noites mal dormidas e dietas desequilibradas favorecem o surgimento precoce de hipertensão, obesidade e diabetes, instaurando um terreno fértil para o AVC em indivíduos ainda ativos profissionalmente.
Reconhecendo sinais e importância do tempo
O sucesso do tratamento depende diretamente da rapidez no atendimento. Os sintomas costumam aparecer de forma súbita e exigem ação imediata. Para facilitar a identificação, o teste SAMU propõe quatro passos simples:
Sorriso – solicitar que a pessoa sorria; a falta de movimento em um dos lados do rosto indica alerta.
Abraço – pedir que levante os dois braços; dificuldade em sustentar um deles sugere comprometimento neurológico.
Música – orientar a repetição de uma frase curta; qualquer alteração na fala reforça a suspeita.
Urgente – diante de um ou mais sinais, acionar imediatamente o serviço de emergência pelo número 192.
Especialistas ressaltam que a chamada “janela terapêutica” é de até quatro horas após o início dos sintomas. Dentro desse intervalo, o uso de medicamentos trombolíticos ou o procedimento de trombectomia mecânica – que remove o coágulo responsável pela obstrução – oferece maior chance de recuperação funcional, especialmente em casos isquêmicos.
Para determinar o tipo de AVC e a área afetada, a equipe médica utiliza recursos de imagem, como tomografia computadorizada e ressonância magnética. O diagnóstico rápido orienta a abordagem adequada e reduz o risco de complicações adicionais.
Tratamento e reabilitação
Diante de um AVC isquêmico, o trombolítico age dissolvendo o coágulo, restabelecendo o fluxo sanguíneo cerebral. Quando há indicação, a trombectomia mecânica complementa a terapia, especialmente em oclusões de grandes vasos. Já nos casos hemorrágicos, o controle da pressão intracraniana e o manejo do sangramento são prioritários, podendo envolver procedimentos cirúrgicos.
Após a fase aguda, inicia-se um processo multidisciplinar de reabilitação, que engloba fisioterapia, fonoaudiologia e terapia ocupacional. O objetivo é recuperar mobilidade, linguagem e habilidades cotidianas afetadas pela lesão. Quanto mais cedo o paciente ingressa nesse programa, maiores as chances de retomar atividades e reduzir a dependência.
Prevenção como estratégia central
Embora os avanços terapêuticos tenham ampliado a sobrevida e melhorado o prognóstico, o consenso entre profissionais de saúde mantém a prevenção como ferramenta mais eficaz. Controlar a pressão arterial de forma regular, adotar alimentação balanceada, praticar atividade física e cessar o tabagismo formam a linha de frente contra o AVC.
Medidas adicionais, como monitorar níveis de glicemia e colesterol, gerenciar o estresse e garantir qualidade do sono, complementam a proteção. A adesão a esses cuidados reduz não apenas o risco de um primeiro evento, mas também a probabilidade de recorrência entre sobreviventes.
A prevalência elevada, os custos hospitalares e a expansão para grupos mais jovens colocam o acidente vascular cerebral no centro do debate sobre saúde pública. Dados oficiais indicam que, se ações preventivas forem amplamente adotadas, a maioria dos casos pode ser evitada, poupando vidas e recursos em um cenário de desafios crescentes.
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