Relatório da ONU projeta primeira queda global de emissões até 2030, mas frisa insuficiência para alcançar 1,5 °C

A Organização das Nações Unidas apresentou novo balanço sobre as Contribuições Nacionalmente Determinadas e constatou, pela primeira vez, uma tendência de queda das emissões globais de gases de efeito estufa antes de 2030; apesar do marco, o documento adverte que o esforço ainda não é compatível com a meta de limitar o aquecimento do planeta a 1,5 °C.
- Contexto imediato: o que o estudo revela
- Quem conduz o levantamento e qual o alcance da metodologia
- Marcos positivos identificados no documento
- Desempenho projetado e lacunas identificadas
- Benefícios econômicos já mensuráveis
- Desigualdade climática e necessidade de apoio adicional
- Três eixos prioritários para a COP30 em Belém
- A conferência de novembro e o momento decisivo
- Sinal de alerta e janela de ação
Contexto imediato: o que o estudo revela
Divulgado como preparação para a 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças do Clima, programada para ocorrer em Belém do Pará entre 10 e 21 de novembro, o relatório analisa o conjunto de planos climáticos conhecidos como Contribuições Nacionalmente Determinadas, ou NDCs. Esses planos, submetidos por cada país signatário do Acordo de Paris, detalham estratégias, metas de redução de emissões e medidas de adaptação ao clima.
O novo exame traz uma constatação inédita desde a adoção do acordo, há uma década: as projeções oficiais apontam que a curva global de emissões começará a descer ainda nesta década. Contudo, a intensidade dessa inclinação é considerada modesta e insuficiente para alinhar o mundo à trajetória recomendada pela comunidade científica para conter o aquecimento em 1,5 °C.
Quem conduz o levantamento e qual o alcance da metodologia
A avaliação foi conduzida pela Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), braço da ONU responsável por monitorar a execução do Acordo de Paris. Embora o estudo se concentre em NDCs que representam cerca de um terço das emissões mundiais atuais, os técnicos complementaram a análise com projeções que incluem compromissos anunciados até setembro de 2025. Esse esforço adicional foi realizado para reduzir lacunas de informação e oferecer quadro mais abrangente sobre as perspectivas de emissões até meados da próxima década.
Marcos positivos identificados no documento
Entre os avanços considerados mais significativos, o relatório destaca pontos que demonstram evolução na qualidade e na abrangência das promessas nacionais. O primeiro deles é a influência do Balanço Global, processo periódico de avaliação coletiva previsto pelo próprio Acordo de Paris. Segundo a UNFCCC, 88 % dos governos apontaram o Balanço Global como referência essencial na atualização dos seus compromissos.
Outro indicador refere-se à extensão das metas no âmbito econômico: 89 % das NDCs agora cobrem todos os setores produtivos, sinalizando que grande parte dos países deixou de restringir as metas a segmentos tradicionais, como energia ou transporte, e passou a incorporar indústrias, agricultura e edificações.
Na dimensão de adaptação e resiliência, 73 % dos planos nacionais incluem estratégias formais voltadas à redução de vulnerabilidades frente a eventos climáticos extremos. Esse percentual aponta crescente reconhecimento de que mitigação e adaptação precisam avançar lado a lado.
O relatório também observa protagonismo de pequenos Estados insulares em desenvolvimento, que passaram a integrar perdas e danos climáticos como componente central das suas NDCs. A inclusão, segundo o documento, demonstra que países mais expostos a impactos como a elevação do nível do mar estão elevando o tom em fóruns diplomáticos para garantir assistência a reconstrução, seguridade alimentar e proteção de infraestrutura costeira.
Questões transversais ganharam terreno: incorporações de igualdade de gênero, participação social, transição justa para trabalhadores e modelos de mercado de carbono previstos no Artigo 6 do acordo foram listadas como evidências de que as NDCs se tornaram instrumentos mais completos ao longo dos últimos dez anos.
Desempenho projetado e lacunas identificadas
Mesmo com avanços, a UNFCCC sublinha que a velocidade atual não é capaz de colocar a humanidade na rota de 1,5 °C. As projeções complementares do relatório indicam que, se todos os compromissos anunciados até setembro de 2025 forem implementados integralmente, as emissões globais poderão ficar cerca de 10 % abaixo dos níveis atuais até 2035. Ainda assim, o corte precisaria ser substancialmente maior para respeitar os orçamentos de carbono estimados pela ciência.
O secretário-executivo da UNFCCC, Simon Stiell, resumiu a conclusão ao afirmar que a trajetória foi finalmente “curvada para baixo”, mas a inclinação permanece tímida. Dessa forma, manter o aumento médio da temperatura dentro do limite pretendido continua a exigir ações adicionais e aceleração de políticas públicas, investimentos e inovação.
Benefícios econômicos já mensuráveis
Mesmo sem alcançar 1,5 °C, o documento destaca retornos tangíveis decorrentes da implementação dos compromissos existentes. Segundo a ONU, milhões de empregos foram criados em setores ligados a energias renováveis, eficiência energética, infraestrutura resiliente e tecnologias de baixo carbono. Trilhões de dólares em investimentos acompanham essa transição, demonstrando que as transformações climáticas deixaram de ser apenas exigência ambiental e passaram a ocupar espaço central em estratégias econômicas.
Uma mudança simbólica prevista para acontecer em 2025 ilustra a tendência: as fontes renováveis devem ultrapassar o carvão como principal matriz de eletricidade no planeta. O relatório interpreta essa virada como sinal de que a economia global está próxima de um ponto de inflexão positivo, no qual tecnologias limpas ganharão escala e competitividade crescentes.
Desigualdade climática e necessidade de apoio adicional
O texto enfatiza, porém, que a transição para energia limpa precisa ser conduzida de forma equitativa. Muitos dos países que hoje sofrem impactos mais severos, incluindo secas, tempestades e perda de território costeiro, contribuíram pouco para a concentração atual de gases de efeito estufa. Para a ONU, garantir financiamento, transferência de tecnologia e mecanismos de compensação é crucial para que essas nações também se beneficiem da economia de baixo carbono.
Três eixos prioritários para a COP30 em Belém
Em preparação à conferência que ocorrerá na capital paraense, o relatório estabelece três prioridades consideradas determinantes:
Primeiro, enviar sinal inequívoco de manutenção da cooperação climática multilateral. O Acordo de Paris depende de confiança mútua e transparência entre as partes; reforçar esse espírito será vital num cenário de tensões geopolíticas e crises simultâneas.
O segundo ponto consiste em acelerar a implementação em todos os setores econômicos. Governos são encorajados a converter metas de longo prazo em políticas concretas de curto e médio prazos, abrangendo energia, indústria, transportes, agricultura e uso do solo.
Por fim, o documento sublinha a importância de conectar a ação climática ao cotidiano das populações, assegurando divisão equitativa dos benefícios e evitando que transições gerem assimetrias sociais ou regionais.
A conferência de novembro e o momento decisivo
Marcada para ocorrer entre 10 e 21 de novembro, a COP30 em Belém do Pará carrega expectativa de detalhar os próximos passos operacionais do Acordo de Paris. Além de revisitar as metas agregadas com base no Balanço Global, os negociadores deverão discutir mecanismos de financiamento para perdas e danos, regras finais de mercado de carbono e iniciativas de fortalecimento da adaptação.
O encontro colocará em evidência a experiência de um estado amazônico, região considerada chave para a regulação climática global. A escolha de sede tem peso simbólico ao aproximar debates diplomáticos dos desafios práticos de conservar florestas tropicais e promover desenvolvimento sustentável na linha de frente do desmatamento.
Sinal de alerta e janela de ação
O panorama apresentado pela ONU é duplo: de um lado, há constatação do custo crescente pago por sociedades em eventos extremos, perda de biodiversidade e impactos socioeconômicos; de outro, desponta oportunidade de reorientar sistemas energéticos e cadeias produtivas rumo a um modelo mais limpo e resiliente. Para a entidade, o mundo permanece “na corrida”, porém precisará acelerar consideravelmente se quiser assegurar condições habitáveis para as próximas gerações.
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